É assim que Maurice Strong, secretário-geral da ONU na altura da 1ª Cimeira da Terra no Rio de Janeiro, em 1992, acredita que se poderiam resolver os problemas do Planeta e dos seus habitantes. O recém-empossado CEO do Planet Earth Institute, Maurício Fernandes, realça esta citação em conversa com o VER, na qual fala também dos principais desafios do desenvolvimento sustentável mundial que, 20 anos depois, estarão novamente em debate na “cidade maravilhosa”
POR HELENA OLIVEIRA

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O Planet Earth Institute (PEI), Organização Internacional dedicada ao processo de Desenvolvimento Sustentável a nível mundial é o “sucessor” do Ano Internacional do Planeta Terra, proclamado pela Assembleia Geral das Nações Unidas em 2008 com o objectivo de promover o conhecimento sobre o potencial das Ciências da Terra, enfatizando o seu contributo na vida dos cidadãos e na salvaguarda do planeta.

No passado dia 9 de Fevereiro, o PEI promoveu, em Londres, uma reunião do Conselho de Administração, cujo tema central incidiu na aprovação do Orçamento e Plano Operacional e teve como resultado modificações organizacionais na Direcção Executiva e a nomeação de novos membros para o seu Conselho de Administração. Uma reunião que terminou com a nomeação de Maurício Fernandes, até então Director Executivo (desde 2007), para a posição de Chief Executive Officer do Instituto.

O VER conversou com o novo CEO do Planet Earth Institute acerca dos principais objectivos e desafios desta organização, mas também sobre a próxima Cimeira das Nações Unidas para o Desenvolvimento Sustentável, o Rio +20, que decorrerá em Junho deste ano e que contará com o PEI como parceiro privilegiado.

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Maurício Fernandes, CEO,
Planet Earth Institute

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Enquanto sucessor do Ano Internacional do Planeta Terra, celebrado em 2008, que objectivos prioritários tem o Planet Earth Institute (PEI) vindo a cumprir?
A cooperação Sul-Sul, ou cooperação Sul Global foi identificada como uma das prioridades do Instituto. Nesse sentido, foi feita uma reestruturação orgânica no instituto envolvendo 80 Comités Nacionais do Planeta Terra formados durante o Ano Internacional.

Das 10 temáticas ambientais consideradas, no biénio 2007-2009, como prementes para a sustentabilidade do planeta [Água Subterrânea, Desastres naturais, Terra e Saúde, Alterações climáticas, Recursos, Megacidades, O interior da Terra, Oceano, Solo e Terra e Vida], é possível eleger as que estão no topo das prioridades actualmente?
É difícil apontar um dos temas como o mais prioritário. Todos os temas estão, de uma forma ou de outra, correlacionados. O mundo é um lugar holístico, onde uma pequena alteração num dos sistemas terá implicações imediatas em todos os outros sistemas e processos. Por exemplo, a Andreia, de manhã se, em vez de ir de transportes colectivos para o trabalho, usa o seu próprio carro, está a aumentar a sua produção directa de Green House Gas (GHG), que irá ter um impacto directo no aumento da temperatura que, por sua vez terá um impacto directo no degelo da Antárctica que, por consequência terá um impacto directo na subida do nível médio da água dos mares. Um problema ambiental com imediatas e directas implicações sociais, políticas e económicas, se pensar que as estruturas portuárias em África que ficarão obsoletas (submersas) num curto espaço de tempo não forem adaptadas. Se pensar que as maiores crises ambientais e humanitárias da actualidade, como a fome, se vivem em África e que o Continente é altamente dependente de importações que chegam ao continente por via marítima, como é o caso da ajuda humanitária, todos nós iríamos de bicicleta para o trabalho.

E que novos temas integrou o PEI na sua área de actuação?
A Igualdade de Género, que durante o Ano Internacional do Planeta Terra não era um dos temas, mas que é hoje um dos temas mais centrais do PEI.

De acordo com informação contida no vosso site, existem cerca de 400 mil cientistas da terra a trabalhar em conjunto com o PEI. Como é possível gerir tanta informação e transformá-la em acções concretas?
Todos os cientistas do mundo estão organizados em Universidades, Centros de pesquisa internacionais e organizações científicas. O Global Scientific Committee do PEI, que distingue o PEI ao nível científico das demais ONGs, é liderado pela University de Newcastle e é um corpo composto por cientistas internacionais que cobrem todas as áreas do PEI e que estão organizados e em comunicação com todas as outras universidades e centros de pesquisa mundial. As ferramentas de social media, como o Facebook e o Twitter dão uma grande ajuda e mantêm um fluxo de informação entre os cientistas e os centros de pesquisa do PEI permanente e diário.

Existem exemplos concretos dessa implementação?
Sim, o Centro de Excelência em Ciências Aplicadas à Sustentabilidade em África (CESSAF), um projecto que já esta na sua fase de implementação e iniciará a formação de PhDs na região da África subsaariana ainda este ano de 2012 é um dos exemplos de programas PEI em implementação. Na América do Sul, por exemplo, também estamos a implementar um programa Vocacional em Economia Verde que irá contribuir para a Rio+20 e está neste momento em seis países: Chile, Argentina, Uruguai, Brasil, Colômbia e Venezuela.

O PEI trabalha igualmente em estreita colaboração com a UNESCO e com a UNSCD. Como funcionam, a nível prático, estas parcerias e que estratégias estão já delineadas para o futuro próximo?
Ambos os programas referidos acima, nomeadamente o CESSAF em África e o programa Vocacional em Economia Verde nas universidades da América Latina, são programas regionais que funcionam em parceria com a UNESCO. Enquanto em África a Delegação de Angola na UNESCO irá candidatar o CESSAF a Instituto UNESCO nível 2 no Concelho Executivo da UNESCO, nas Américas a parceria é com a Divisão da UNESCO para América Latina e Caribe através da assinatura de um MoU [memorando de entendimento] entre ambas as organizações. A SMART – Sustainable Mining Africa Round Tables – que irá agora para a sua terceira edição, depois de Luanda e São Paulo terem recebido o programa, é uma parceria com a UNCSD.

Também de acordo com o vosso site, o PEI está envolvido em várias iniciativas e projectos concebidos para promover e facilitar o desenvolvimento sustentável. É possível dar exemplos de alguns destes projectos?
O PEI, para além de ter como responsabilidade o desenvolvimento de projectos ainda na sua fase conceptual, como é o caso da SMART com a UNCSD, ou do CESSAF com a UNESCO, ou de variadíssimas outras acções que envolvem a publicação Planet Earth e exposições de fotografia, tem depois a capacidade política de trazer as diferentes partes, stakeholders públicos e privados, necessários à implementação dos programas a nível local e regional. No entanto, cada vez mais, o PEI vem desenvolvendo um elemento muito forte na implementação dos seus projectos no terreno, uma capacidade operacional internacional que se tem vindo a afirmar como uma das vantagens diferenciais do PEI relativamente às demais organizações.

Foi muito recentemente nomeado como CEO do PEI. Que principais desafios pensa vir a enfrentar neste novo cargo?
Continuando na linha de pensamento do ponto anterior, vejo o elemento da implementação no terreno, o elemento da execução como um dos meus principais desafios. O CESSAF, em Luanda, os novos centros do PEI no Rio de Janeiro que apoiará a ONU Rio+20 já em Junho e o Centro do PEI na cidade de Nova Iorque, que irá funcionar como escritório de ligação do PEI à ONU, fazem parte dos desafios imediatos. Num aspecto mais conceptual, a transformação dos valores do Instituto em cultura PEI que, depois de escritórios estabelecidos na Europa, África, Estados Unidos e América Latina, verá o PEI chegar à Índia, estará no topo da Agenda.

O PEI está a acompanhar de perto as reuniões preparatórias para o Rio+20, em Junho próximo. A economia verde no contexto da erradicação da pobreza e a definição de um quadro institucional para o desenvolvimento sustentável são os dois grandes temas estabelecidos para esta Cimeira da Terra 2012. E espera-se que os líderes mundiais se comprometam com 10 novos objectivos de desenvolvimento sustentável para o planeta e com a promessa de criação de economias verdadeiramente verdes. Existem já “rumores” destes novos objectivos? Pode adiantar algo sobre os mesmos?
Em Dezembro passado, na sede das Nações Unidas em Nova Iorque, aquando da 2ª reunião inter-sessional da Rio+20 e na qual o PEI participou, tive o prazer de conhecer uma das figuras mais importantes do Desenvolvimento Sustentável mundial: Maurice Strong, que foi o secretário-geral da ONU para a 1a cimeira da Terra no Rio de Janeiro em 1992. O discurso do Mr.Strong assentou na necessidade de uma parceria global entre os cidadãos do mundo como única forma de resolver os problemas do Planeta e do Homem, visto os governos terem de ser pressionados pelo eleitorado para adoptar as necessárias políticas. Eu e os cerca de 50 delegados internacionais presentes, ficámos um tanto ou quanto maravilhados, mas boquiabertos, com a sugestão, devido à dificuldade de base da sua implementação. Isto para lhe dizer que depende de nós todos fazer essa parceria ou fazer com que os políticos e governos deste mundo tomem as medidas certas.

Apesar das suas muitas e boas intenções, são muitos os analistas que prevêem que esta Cimeira seja mais um fracasso, nomeadamente porque aos líderes não será exigido que assinem qualquer documento que obrigue legalmente os seus países a cumprir objectivos ou calendários em particular, mas sim que sejam eles a estabelecer os seus propósitos e a trabalharem, voluntariamente, para definir uma economia verde global, mediante a qual a ONU acredita ser possível reduzir a pobreza e o baixo consumo. Que expectativas, realistas, tem para os resultados desta grande e simbólica Cimeira?
Mantendo a mesma linha de experiências em entrevistas com actores do Desenvolvimento Sustentável, em Novembro passado, numa reunião em Brasília com a Ministra do Meio Ambiente Brasileiro, aprendi um ditado impressionantíssimo em relação às expectativas ambientais e a um certo optimismo em torno da Cimeira.

Um optimista é alguém com falta de informação (é claro que em tom de brincadeira). Agora num registo mais sério, a Rio+20 é, sem dúvida, uma das mais importantes acções do início do século XXI. O PEI está ligado, desde o início da organização, e é o parceiro principal para a organização da Rio+20 Partnairship Fair de 20 a 22 de Junho.

Enquanto português, que “nota” daria ao desenvolvimento sustentável em Portugal?
Julgo que o país está enquadrado nas metas e nas políticas europeias há muito traçadas. No entanto dava uma nota muito mais alta ao Português enquanto língua oficial de oito países e à responsabilidade da língua como actor principal no processo do Desenvolvimento Sustentável. O Brasil nas Américas, em conjunto com Angola, Moçambique, Guiné, São Tomé e Cabo Verde, poderão desempenhar um papel de liderança em matérias de desenvolvimento nas suas regiões.

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