O Porto recebe nos dias 5 e 6 de Junho o Encontro Internacional do Sinergias ED, que encerra a segunda edição do projecto, dedicado à reflexão da educação para o desenvolvimento enquanto proposta transformadora, com um desafio: proporcionar um momento de “experimentação, reflexão crítica, diálogo e partilha de experiências” sobre o que significa conhecimento e o papel da colaboração entre pessoas e entidades na transformação social. O VER conversou com a equipa organizadora e com a oradora internacional convidada, Ana Dubeux, que irá dinamizar o evento com instalações pedagógicas, uma das metodologias participativas que, a par com as rodas de diálogo e os carrosséis pedagógicos, proporciona o diálogo entre saberes
POR GABRIELA COSTA

“Ser sujeito da sua aprendizagem significa reflectir sobre a realidade de forma crítica e indagar para que serve e a quem serve o conhecimento”– “Pedagogia da Autonomia” – Paulo Freire (1996), em “Economia solidária, educação popular e pedagogia da autogestão – reaprendendo a aprender pelas veredas da descolonização do saber no Nordeste

No âmbito do Encontro Internacional “Sinergias para a transformação social – colaboração e conhecimento”, que se realiza a 5 e 6 de Junho na FLUP – Faculdade de Letras da Universidade do Porto, a educação para o desenvolvimento (ED) estará em debate, e desta vez na acepção literal da participação crítica e reflexiva.

O evento, organizado pela FGS – Fundação Gonçalo da Silveira em colaboração com o CEAUP – Centro de Estudos Africanos da Universidade do Porto e o CIDAC – Centro de Intervenção para o Desenvolvimento Amílcar Cabral, vai reunir um conjunto de oradores do meio académico e de organizações como o Instituto Camões e o Global Education Network Europe com membros do grupo Sinergias ED (projecto no âmbito do qual se realiza este Encontro Internacional), abrindo a reflexão a todos os participantes.

O VER, na qualidade de media partner do evento, conversou com a equipa organizadora do “Sinergias para a transformação social – colaboração e conhecimento”, e com a oradora internacional convidada, a investigadora daUniversidade Federal Rural de Pernambuco, Ana Dubeux, a respeito da antevisão desta iniciativa, cujo programa promete dinamizar diálogos educativos para a transformação social a partir das muitas reflexões e aprendizagens do projecto Sinergias ED, ao longo dos seus três anos e meio de vida, e analisar de forma crítica o papel da colaboração na criação de conhecimento, a partir de fundamentos teóricos e boas práticas, abordando ainda as percepções e a relevância da ED em Portugal, a partir dos resultados de dois estudos.

Fazer emergir a transformação social

Ana Dubeux, investigadora na Universidade Federal Rural de Pernambuco

Levando ao Encontro Internacional do Sinergias ED uma proposta metodológica – Instalações Pedagógicas “Colaboração e Conhecimento” -, Ana Dubeux diz que o desafio é “fazer emergir” os saberes “importantes de serem partilhados” que “partiremos do princípio que todos os participantes possuem”, e não apenas os especialistas em determinadas temáticas. Na sequência desta partilha, a ideia é “propor estratégias para que os mesmos sejam sistematizados”, sublinha a investigadora da Universidade Federal Rural de Pernambuco.

Como explica, “normalmente os encontros científicos apresentam uma estrutura muito similar. São espaços de enorme rigidez metodológica onde predominam apresentações curtas com uso de diapositivos projectados e com poucos espaços para debate e reflexão”. O que muitas vezes provoca “uma sensação de frustração que nos invade, pois temos sempre o desejo de querer trocar e reflectir mais sobre tantas questões que emergem no confronto de experiências tão diversas”. Assim, e perante a proposta de um encontro que discute processos colaborativos entre universidade e sociedade, “não poderíamos propor uma metodologia clássica”, conclui.

Segundo a investigadora, inspiradas nas metodologias da educação popular, as rodas de diálogo, as instalações pedagógicas e os carrosséis pedagógicos são ferramentas de metodologia participativa que proporcionam o diálogo entre saberes, colocando todos numa condição de igualdade nos debates e proporcionando interacção e complementaridade. Neste processo, especialistas e demais participantes “alimentam-se mutuamente de um processo de aprendizagem muito criativo e inovador, que contribui pouco a pouco para transformar as estruturas das instituições historicamente responsáveis pela construção da ciência na sociedade”.

[quote_center]Inspiradas na educação popular, as ferramentas de metodologia participativa colocam todos numa condição de igualdade, proporcionando interacção e complementaridade[/quote_center]

Esta metodologia participativa vai constituir a dinâmica das várias intervenções de Ana Dubeux, e a especialista espera que o público português “esteja aberto a esta construção de tradição latino-americana, pouco praticada na Europa, mas muito eficaz para os processos de construção do conhecimento que se propõem ser colaborativos”.

Reconstruir os sentidos da educação para o desenvolvimento

O evento encerra a segunda edição do projecto Sinergias ED, o qual tem vindo a estimular a colaboração entre o meio académico e a sociedade civil para as questões da transformação social a partir da educação para o desenvolvimento (ver Caixa).

O primeiro Encontro Internacional do projecto Sinergias ED realizou-se em 2016, no âmbito da primeira edição do projecto. Dois anos e meio depois, o projecto “continua a reflectir a educação para o desenvolvimento enquanto proposta de educação transformadora, que se vai (re)construindo num processo contínuo de acções e reflexões múltiplas e diversificadas, alimentadas pelos actores que lhe dão corpo, em diálogo com os contextos que os envolvem”.

Como explica ao VER a equipa organizadora, o Sinergias ED vai fazendo destas (re)construções o seu próprio percurso, contando para isso com a participação de um grupo alargado de pessoas e entidades que, através do envolvimento nos encontros e actividades do projecto e na partilha de reflexões e experiências, vão traçando um caminho conjunto. Desta forma, os focos da segunda edição do projecto Sinergias ED “foram sendo estabelecidos nos vários questionamentos que foram surgindo”. Em particular, e a partir das reflexões sobre o que é conhecimento, o que significa colaborar e que ligações se podem estabelecer entre estas duas dimensões, foi-se tecendo o tema deste Encontro.

Com o objectivo de assegurar “a continuação lógica da participação crítica e reflexiva e do envolvimento dos públicos neste projecto”, o Encontro Internacional agendado para Junho deverá constituir “um momento de experimentação, reflexão crítica, diálogo e partilha de experiências sobre o que significa conhecimento e sobre o papel da colaboração entre pessoas e entidades na transformação social”. No evento serão igualmente apresentadas, partilhadas e discutidas as experiências proporcionadas pelo projecto Sinergias ED e os resultados que alcançaram, com a participação de várias pessoas que estiveram directamente envolvidas nas suas actividades.

[quote_center]O evento foge a modelos convencionais para dar voz aos participantes, desafiando-os à reflexão e à experimentação para além da escuta[/quote_center]

Como esclarece a equipa organizadora, para se entender a opção tomada relativamente à escolha do tema deste segundo Encontro é necessáriorecuar ao primeiro Encontro do Sinergias ED, realizado em Janeiro de 2016: “estávamos nessa altura a terminar a primeira edição do projecto e pretendíamos claramente colocar na agenda esta necessidade de reflexão conjunta sobre a educação para o desenvolvimento enquanto proposta de educação transformadora”.

O evento teve como tema “Diálogos sobre Desenvolvimento” e contou com a participação de mais de cem pessoas ligadas ao mundo académico, à investigação e também a diversas organizações da sociedade civil. Ao final de duas edições dedicadas a esta temática, “constatamos que este foi um momento basilar no trabalho colaborativo do Sinergias ED, contribuindo para que o projecto continue hoje a ser um espaço facilitador de (re)construção de sentidos para a ED”, concluem os responsáveis.

Construir o conhecimento colaborativamente

Desde então, a FGS manteve a aposta em processos contínuos de acção e reflexão, “múltiplos e diversificados, alimentados pela participação de um grupo alargado de pessoas e entidades que se envolvem” nos encontros e actividades deste projecto. Ao longo deste percurso foram surgindo questões e temas prioritários que deram origem aos focos temáticos da segunda edição do projecto Sinergias ED: o que entendemos por conhecimento; que lógicas estão subjacentes aos actuais formatos predominantes de construção do conhecimento e que consequências elas geram, nomeadamente em termos de justiça social; o que significa colaborar; como é que a ED pode contribuir para os processos de transformação social gerados a partir destes questionamentos.

[quote_center]O projecto Sinergias ED vai-se (re)construindo num processo contínuo de acções e reflexões múltiplas, em diálogo com os contextos que os envolvem[/quote_center]

Ora, foi através das ligações que se foram estabelecendo entre estas várias dimensões, como referido, e tendo a mente a sua relevância para o projecto Sinergias ED, que “de forma muito natural se foi tecendo o tema do Encontro – colaboração e conhecimento – o que representa também a continuação lógica da participação crítica e reflexiva e do envolvimento e empenho dos vários parceiros e públicos neste projecto”, sublinham os responsáveis da equipa organizadora da iniciativa.

Nas suas palavras, nesta segunda edição do Encontro internacional do projecto “desafiámo-nos entre nós, na equipa, a propor um evento diferente do habitual. Fugimos a modelos mais convencionais, em que um conjunto de oradores convidados traz propostas para a audiência, para dar voz aos participantes, desafiando-os à reflexão e à experimentação para além da escuta e assumindo, assim, uma busca de coerência com os princípios de base do próprio projecto. Este será, por isso, e de certo modo, um evento mais horizontal do que vertical”.

Na antevisão que faz ao evento, a equipa organizadora sublinha ainda que a presença de Ana Dubeux ao longo dos dois dias do Encontro “será uma ajuda importante neste processo: no fundo, mais do que falar (e ouvir falar) sobre colaboração e conhecimento, queremos proporcionar um momento de reflexão crítica e partilha de experiências entre todos os presentes”.

Nesta perspectiva, o Encontro está aberto a todos aqueles que se identificam e têm interesse no tema da transformação social, não sendo necessário nenhum requisito ou experiência prévia nestes contextos ou áreas de trabalho para a sua participação. A par das conversas e reflexões que se pretendem gerar, serão conhecidos e avaliados os resultados do projecto Sinergias ED.


Sinergias entre Academia e organizações

Procurando responder à necessidade crescente de conectar o conhecimento produzido pela I&D com a actuação no terreno no campo da ED, o projecto “Sinergias ED: Fortalecer a ligação entre investigação e acção na Educação para o Desenvolvimento em Portugal” tem como objectivo promover a qualidade de intervenção da ED em Portugal.

Para tanto, o projecto trabalha há já três anos e meio para alargar e reforçar os processos de colaboração entre Instituições de Ensino Superior (IES) e Organizações da Sociedade Civil (OSC), produzir e divulgar estudos e trabalhos de investigação no âmbito da ED, a nível nacional e internacional, e promover e reforçar a capacitação em ED de actores quer do meio académico quer da sociedade civil.

Fonte: Fundação Gonçalo da Silveira