Qualquer vidente de jornal de supermercado, taróloga socialite ou economista de programa de rádio vos sabe dizer as previsões para 2013. É canja, tem os oráculos a seu favor e os segredinhos de corredor privilegiados. Falham quase sempre, mas isso é vantagem, porque a seguir são novamente chamados para explicar porque falharam. Eu sou mais calculista e prefiro as pósvisões, uma espécie de revisitação do passado mas agora a cores, pois se é para manipular opiniões e distorcer realidades prefiro trabalhar com factos
POR NUNO OLIVEIRA

Qualquer vidente de jornal de supermercado, taróloga socialite ou economista de programa de rádio vos sabe dizer as previsões para 2013. É canja, tem os oráculos a seu favor e os segredinhos de corredor privilegiados. Falham quase sempre, mas isso não é problema, é vantagem, porque a seguir são novamente chamados para explicar porque falharam e, em retrospectiva, qualquer história bem contada soa verosímil. Eu sou mais calculista e prefiro as pósvisões, uma espécie de revisitação do passado mas agora a cores, pois se é para manipular opiniões e distorcer realidades prefiro trabalhar com factos.

Então aqui vai: Grandes Revelações do que foi ou podia ter sido 2012 A.D.

Janeiro: o navio cruzeiro Costa Discordia encalha ao largo de Atenas e ameaça levar ao fundo não só a Grécia como Portugal, Espanha, Itália e Irlanda, enquanto a sua capitã anda na farra com os seus três almirantes e a colocar fotos das previsões de recuperação económica dos países resgatados em páginas satíricas no Facebook.

Fevereiro: não chove uma única gota em Portugal, a seca e o desespero instalam-se na perspectiva de mais uma machadada na já frágil agricultura portuguesa. A ministra da agricultura e eteceteras manda uma reclamação oficial e em papel selado a Nossa Senhora por não lhe ter ligado nenhuma quando ela começou a rezar para que a coisa se resolvesse.

Março: Vladimir Putin é (re?)eleito presidente da Rússia e manda recado a Obama a dizer que desta vez o prémio Nobel da paz vai ser dele e quer recebê-lo ao som do popular hit das Pussy Riot “Putin Lights Up the Fires” que irá substituir o velho e gasto hino da Internacional.

Abril: O Governo português anuncia a suspensão das reformas antecipadas até final do programa de assistência financeira, isto é, até 2034 ninguém se reforma e estão proibidos de ficar doentes se derem mais despesa do que uma canjinha e um chá de limão com leite; caso já sejam avós, receberão uma multa da SS todos os meses em que não pedirem mais netinhos aos filhos e respectivo par.

Maio: O Chelsea ganha a final da Liga dos Campeões frente ao Bayern de Munique, na decisão por grandes penalidades e em Munique. Angie irrita-se e para descarregar as frustrações liga ao ministro Gaspar (nota do autor: eu não sou parente deste senhor) e manda-o aplicar mais umas medidas correctivas, perdão, de ajustamento financeiro, porque precisa de qualquer coisa que a anime e lhe baixe a tensão que chegou aos 22/12 no último penálti.

Junho: A Espanha formaliza um pedido de ajuda financeira para a banca espanhola no valor de 100 mil milhões de Euros. O preço dos caramelos dispara, o famoso-supermercado-espanhol-com-nome-de-país-estrangeiro passa a ter black fridays também às Terças e primeiro Domingo de cada mês. Álvaro inquieta-se com os números das exportações para Espanha, com medo que Gaspar (nota do autor: não sei se já deixei suficientemente claro que não tenho nenhum tipo de parentesco com este senhor) o mande de castigo (outra vez), contar as facturas não pagas pelo Estado de todos os QREN’s submetidos nos últimos seis meses.

Julho: O CERN anuncia a descoberta do Bosão de Higgs, a tal partícula de Deus que em boa verdade se deveria ter chamado ‘o-raisparta-da partícula’. Por cá ficamos pela descoberta da particularidade de se poder vir a refundar o Estado Social enquanto medida de salvação da economia nacional ao mesmo tempo que fica claro que todos os contratos das PPPs estão blindados e não podem ser mexidos. Uma particular forma de demonstrar o papel do Estado.

Agosto: A sonda Curiosity chega a Marte após nove meses de viagem e inicia a sua busca por vestígios de vida. Em Portugal contabilizam-se mais de 65 mil pessoas com educação superior a sair do país em busca de vestígios de dignidade.

Setembro: 15 de Setembro. Não sei, não vi, não ouvi e se sei, ouvi ou vi o que se passou nas ruas cheias de manifestantes em silencioso pesar, angústia e profundamente indignados com um governo autista que governa para fora e não é capaz de gerar quaisquer tipo de empatia ou solidariedade com um número crescente de cidadãos foi porque uns amigos meus falaram disso no facebook, esse ninho de anarquistas e agitadores.

Outubro: um tipo chamado Felix Baumgartner atira-se da estratosfera e cai durante quatro minutos, o que é notícia em todo o mundo. Um país cheio de tipos “infelixes” que está a cair a pique há dois anos já é visto como um caso de ajustamento económico de sucesso pelos que o estão a empurrar a toda a força. Ao que parece até já passámos a barreira do som, porque ninguém nos ouve.

Novembro: Christine Lagarde, presidente do FMI manda aos portugueses um postal de “desejos de melhoras” depois de no mês anterior se ter manifestado genuinamente preocupada com a saúde financeira do país. Os postais chegam à cobrança e colectam mais 0,00000001% da dívida que temos à troika, só da parte dos juros.

Dezembro: Passos Coelho explica pela milésima vez a Gaspar (nota do autor: acho que vou mesmo mudar o meu apelido do meio) que não vai propor que o Natal deixe de ser feriado e passe a ser o Dia Nacional da Antecipação do Pagamento da Sobretaxa Especial Sobre o IRS. Em Belém, alguém se delicia a pensar que é outra vez época de bolo-rei.

Biólogo e CEO da NBI – Natural Business Intelligence