Foi-me lançado o desafio de perspetivar o ano de 2023, de partilhar como, na empresa em que trabalho e na ACEGE NEXT, nos preparamos para enfrentar este novo ano. Este exercício é especialmente difícil porque 2023 sucede a dois anos completamente imprevisíveis: um marcado pela pandemia e outro pelo ressurgir da guerra na Europa. O esforço possível foi identificar oito marcos que certamente iremos encontrar ao longo dos próximos 12 meses
POR MANUEL TOVAR

I. Entramos no ano de 2023 sem a presença de um dos grandes pensadores deste século. O Papa Bento XVI, que tocou especialmente o nosso país com a sua visita em 2010, deixa uma obra que marcou fortemente o público mais intelectualizado e que ganha agora uma dimensão mais acessível e transcontinental no modo de comunicar de Francisco.

II. Não é difícil de prever que este ano será marcado pela continuação da Guerra na Ucrânia e pelo pesado clima de polarização entre as democracias liberais ocidentais e os regimes autoritários da China e da Rússia. Não perdendo do horizonte o objetivo universal de descarbonização progressiva dos processos de produção e consumo das nossas economias.

III. Em Portugal, poderemos viver o ano mais decisivo desta década: um ano já sem pandemia, mas condicionado pela carestia energética, alimentar e de habitação, em que terão de ser aplicados os investimentos sem precedentes do Plano de Recuperação e fundos estruturais.

A crise que abalou o país na última década representou um enorme sofrimento para as famílias, mas deixou-nos uma esperança e uma lição para enfrentar os atuais desafios. A esperança de que as dificuldades sentidas tenham deixado o tecido empresarial mais resiliente que no início do milénio, e o mandato de protegermos o emprego sem recorrer ao endividamento.

IV. Já a Europa enfrenta dois desafios adicionais. Por um lado, Bruxelas terá de encontrar a melhor forma de coabitação e colaboração com os estados que tomaram formas mais nacionalistas de governo como a Hungria, a Polónia e a Itália. Por outro lado, as ondas de choque que a decisão britânica de se separar do Continente produziram, continuarão a sentir-se nos problemas que colocou à sua governação e economia e o agudizar das tensões territoriais com a Escócia e a Irlanda, em que esperamos que Carlos III venha a dar o seu contributo.

V. O ambiente de conflito que vivemos deve fazer-nos voltar a olhar para o essencial. A economia digital fornece-nos novas formas de respondermos aos problemas do passado, mas coloca-nos novos desafios que devem ser resolvidos com as capacidades humanas mais analógicas. 

É difícil dizer como será o ano de 2023, pois existem muitas variáveis que podem impactar o futuro. No entanto, algumas tendências que podem moldar o ano incluem:

  • Avanços na tecnologia e automação, que podem levar a mudanças na forma como trabalhamos e comunicamos;
  • Instabilidade económica e política, com impactos potenciais no comércio e nas relações internacionais;
  • Esforços para abordar questões como as mudanças climáticas, as desigualdades e a saúde pública.

O parágrafo anterior foi escrito pelo Chat GPT, um demonstrador de novas tecnologias de Inteligência Artificial, lançado pela empresa americana Open AI. Apenas mais um exemplo de como a computação pode auxiliar o nosso trabalho em qualquer função, mas também dos desafios éticos e sociais que poderá colocar.

VI. Neste ano deveremos também acolher inovações legislativas. O imperativo ambiental irá exigir-nos uma transição sustentável para uma Economia Circular, impondo novas regras como a responsabilidade alargada do produtor, a proteção do direito à reparação dos equipamentos e um sistema nacional de depósito e reembolso de embalagens.

VII. No mercado laboral, as lideranças não podem temer testar novas formas de trabalho, com a flexibilização do horário e do local de trabalho. Mas os valores da flexibilidade e conveniência não deverão atropelar as garantias de estabilidade de que a geração anterior beneficiou, como tem acontecido no trabalho em plataformas para motoristas e estafetas. Os governantes também não poderão cair na tentação de coagir as empresas com tensões populistas que minem a produtividade, a cooperação no seio das organizações e a capacidade do país em convergir de forma aberta com as economias livres mais avançadas.

VIII. Finalmente, não poderemos permitir que a pandemia de COVID-19 seja substituída por uma verdadeira epidemia da solidão, que afeta a nossa sociedade individualista e envelhecida, e que as estruturas familiares já não são capazes de combater. O desafio demográfico é o mais sério que temos pela frente e que só pode ser respondido com o incentivo à natalidade, a abertura controlada à imigração, o desenvolvimento do interior e do sector social e não com o ataque ao valor da Vida, que continua a ser promovido por alguns sectores da nossa política.

Manuel Tovar

Tem 28 anos, é formado em direito e co-fundador da The Loop co., empresa de tecnologia para a sustentabilidade. É também responsável pela ACEGE NEXT em Coimbra