Com quatro gerações distintas a conviver no local de trabalho, seria de esperar que as suas expectativas em relação à carreira e à vida profissional no geral fossem igualmente diferentes. Mas não é isso que acontece. Um bom salário, flexibilidade e desafios são desejos comuns aos mais jovens e aos mais velhos, se bem que com ligeiras alterações. Mas num era em que a escassez de talento continua a aumentar, saber exactamente o que querem os trabalhadores é crucial para as empresas que os desejam atrair e reter
POR HELENA OLIVEIRA

A escassez de talento está a aumentar em quase todo o mundo, com recordes a serem batidos, ano após ano, nos Estados Unidos, Suécia, Finlândia, Hungria e Eslovénia, com apenas 18% dos 15 países inquiridos pelo ManpowerGroup, num estudo realizado com 14 mil trabalhadores, a não sofrerem deste fenómeno. E, no geral, 54% das empresas auscultadas reportam escassez de talento, um valor que quase duplica comparativamente há uma década.

Assim, e para perceberem, atraírem e reterem o melhor talento enquanto a concorrência está a tentar fazer exactamente o mesmo, as empresas precisam de saber o que querem e mais valorizam os trabalhadores. O estudo, intitulado “Closing the Skills Gap: What Workers Want”, tenta aferir o que atrai os empregados numa organização, o que os retém na mesma e de que forma é que estes sentimentos variam em termos geográficos, de género e em diferentes fases da carreira.

E, apesar de os desejos dos trabalhadores variarem em particular no que respeita à geração a que pertencem, mais salário, maior flexibilidade e um trabalho desafiante são requisitos comuns a todos eles.

O dinheiro é importante, mas não chega

De acordo com o estudo e sem grandes surpresas, a remuneração é a “atracção top” e o factor mais importante de retenção para todos os trabalhadores menores de 65 anos, independentemente do seu género ou geografia. Contudo, os salários estão a crescer a metade do ritmo comparativamente há uma década, em particular para os que têm rendimentos menores. E a verdade é que as competências contam e muito: trabalhadores com funções mais procuradas, como cibersegurança, computação na nuvem, programação, cuidados de saúde, entre outros, assistiram a um aumento dos seus salários na ordem dos 10% ao longo do mesmo período. Mas a verdade é que as empresas precisam de ser criativas para aumentarem as compensações para além dos salários no sentido de se diferenciarem e atraírem talento. E quando 89% dos inquiridos nos Estados Unidos desejariam ter mais benefícios para além do salário, não são de pipocas ou de mesas de ping-pong que falam. Autonomia e flexibilidade no trabalho, licenças parentais e políticas que cultivem o bem-estar e melhorem o estilo de vida estão na lista de prioridades, igualando o peso do salário na equação. Adicionemos a isso incentivos financeiros atractivos e gestos de boa vontade que recompensem a lealdade, em conjunto com aprendizagem e desenvolvimento – reembolso de custos com formação ou pagamento de propinas – e as empresas terão melhores probabilidades de atraírem e reterem os melhores talentos.

Trabalhadores querem personalização e avaliação

Por seu turno, e num mundo crescentemente inundado por dados onde os algoritmos existentes nos frigoríficos sabem isto e a inteligência Artificial sugere que se compre aquilo, as pessoas esperam o mesmo do seu trabalho. Ou seja, desejam incumbências que testem as suas capacidades, projectos que exijam o melhor de si mesmos e recomendações para a sua próxima função. Querem conhecimento, reconhecimento e acompanhamento para uma boa performance hoje e ganhar potencial para que a mesma melhore amanhã. E é aqui que entra a avaliação, crítica para compreender o potencial humano, e a qual permite que os empregadores tenham uma maior equivalência entre funções e pessoas, motivando em simultâneo os empregados a saberem mais sobre si próprios. Tal como os demais consumidores, os trabalhadores também querem uma maior “experiência de utilizador”, ou seja, desejam ter um conhecimento personalizado para perceberem os seus pontos fortes e potencial. E, para que tal aconteça, precisam de uma avaliação cientificamente validada, esperando algo em troca pelos seus dados. Querem também conversas sobre a sua carreira e clamam por coaching para estabelecerem objectivos, gerir o seu desenvolvimento e controlar a sua ascensão profissional.

Contudo, e de acordo com dados do estudo, apenas 49% dos empregados, a nível global, é que foram avaliados, com 81% destes a reportarem uma maior satisfação com o trabalho comparativamente a 65% dos que não foram objecto de avaliação.

A variedade anima a vida profissional

Como já anteriormente mencionado, o desafio inerente ao trabalho consta do top 5 das prioridades de trabalhadores de todas as idades, o que significa um conjunto alargado de coisas. Educação e formação, sim, mas mais do que isso: oportunidades de crescimento, avaliações rotativas, aprendizagem on-the-job, projectos estimulantes e trabalho ágil em várias equipas e funções, aplicação de novos conhecimentos em funções novas, bem como sentirem-se mais testados e terem objectivos de carreira bem definidos.

Adicionalmente, as pessoas desejam ter um portefólio de trabalho que ofereça variedade, alargue as suas experiências e desenvolva o seu conhecimento e as competências. Querem ter a oportunidade de se desenvolverem e ganharem mais. Para conferirem os desafios e as oportunidades para que as pessoas se sintam bem-sucedidas, os empregadores precisam de ter conhecimento das suas competências, potencial e desejos. E com uma política de avaliação e com uma cultura de aprendizagem – com a ajuda de coaching, por exemplo – é mais fácil prosperar. Uma abordagem “nada ou afoga-te”, sem qualquer tipo de apoio, pode resultar numa paralisia de procrastinação ou até em burnout.

Por outro lado, é natural que os mais jovens, que entram pela primeira vez na força laboral, precisem de mais apoio comparativamente a um líder emergente a meio da sua carreira. Os gestores precisam de ter competências de coaching para orientar as pessoas na mobilidade da sua carreira, para abraçar novas oportunidades e dar as boas-vindas à exposição que conduz ao sucesso pessoal e profissional. Todavia, apenas 16% dos empregados inquiridos afirmam ter conversas com os seus gestores sobre as suas carreiras, ao passo que aqueles cujos superiores hierárquicos dão ouvidos aos seus problemas relacionados com o trabalho têm 62% a menos de probabilidades de virem a sofrer de burnout.

Criar uma cultura de aprendizagem

Os empregadores têm a noção crescente de que precisam de requalificar a sua força de trabalho e muitos são aqueles que o estão a fazer por conta própria. Todavia, ter consciência desta necessidade, ter boas intenções e confiar em portais online de aprendizagem não é suficiente. Cerca de dois terços das organizações auscultadas oferecem formação gratuita, mas os empregados afirmam que também precisam de tempo, apoio e orientação para a conseguirem capitalizar. Assim, as empresas têm estimular uma cultura de aprendizagem para atrair e reter os talentos de topo e para encorajar toda a força de trabalho a envolver-se na aprendizagem contínua. Os gestores também precisam de compreender de que forma é que as motivações para aprender variam de acordo com a posição que a carreira ocupa no ciclo de vida de cada um e que tipo de responsabilidades estes têm de equilibrar. Quando o tempo, o dinheiro e a ausência de apoio constituem os maiores obstáculos à aprendizagem, os trabalhadores querem, em contrapartida, períodos de tempo dedicados para a sua própria aprendizagem, resultados céleres e retorno do investimento que fizeram em termos desse mesmo tempo.

A produtividade é mais importante que o “presentismo”

Os trabalhadores estão a dar prioridade ao equilíbrio e à escolha e isso não é negociável. As pessoas querem escolher onde, quando e como trabalhar e isso não significa quererem fazer menos. Desejam, sim, o aspecto social do trabalho em conjunto com a flexibilidade para acomodar as exigências de uma “Única Vida” e o aumento do seu bem-estar. Ou e em suma, as pessoas querem flexibilidade e querem trabalhar a partir de casa ou de outro sítio qualquer, desejam semanas de trabalho de quatro dias ou horários diários mais curtos que promovam a produtividade e preservem os fins-de-semana, bem como licenças parentais para equilibrar o tempo com a família e que, em muitos casos, são mais valiosas do que os próprios salários.

E para aproveitar toda a sua pool de talento e reter uma força laboral de prestígio, os empregadores têm de saber gerir o equilíbrio da flexibilidade e recompensar a produtividade em detrimento do “presentismo”. É a cultura empresarial que tem de promover estas mudanças, bem como os líderes a devem encorajar, pois a felicidade fora do trabalho pode ser a felicidade no trabalho.

Trabalhar na economia do propósito

Os trabalhadores querem sentir-se orgulhosos relativamente ao sítio em que trabalham, bem como sentir orgulho naquilo que fazem. Marcas fortes, reputações sólidas, bons locais para trabalhar e oportunidade para se ter impacto integram o top 10 das razões devido às quais se trabalha numa organização.

Nesta era hiper-transparente, as pessoas querem adquirir marcas que tenham um propósito social alargado e que estejam alinhadas com os seus valores. E querem trabalhar para elas também. As empresas com propósito e que se comprometem genuinamente com as suas pessoas, com as comunidades em que operam e com o planeta são crescentemente procuradas pelos trabalhadores. E aspirar a um trabalho com significado e propósito não é, de forma alguma, apanágio apenas das gerações mais jovens: pelo contrário, é muito mais importante para aqueles com mais de 65 anos do que para os jovens da geração Z que começam agora a entrar para as fileiras laborais.

Todavia, e quando o propósito não é assim tão conhecido e a marca não é assim tão forte, as empresas têm de trabalhar mais arduamente para explicar o seu “porquê”. Com 45% da população global com presença nos media sociais, as pessoas seguem cada vez mais as carreiras de amigos e até de desconhecidos. E as empresas precisam de uma verdadeira aprovação por parte dos seus empregados. As avaliações online, as qualificações dadas entre pares e os rankings estão a substituir o boca-a-boca da vida real no que respeita a recomendações. As empresas têm de conhecer os seus actuais e futuros trabalhadores onde estes estão e trabalharem arduamente para serem alvo de boas recomendações, de elogios e de níveis elevados de aprovação para que possam construir a sua marca e a sua reputação. E a forma como a organização se comporta no interior é tão ou mais importante que a imagem que exporta para o exterior.


Geração a geração, o que mais valoriza quem trabalha?

No geral, os desejos dos trabalhadores das quatro gerações que coabitam nas fileiras laborais não diferem sobremaneira. Mas valorizam-nos de forma distinta.

Começando pelos que entraram mais recentemente no mercado de trabalho, a geração Z , e que integra jovens dos 18 aos 24 anos, o dinheiro é o que mais importa, em particular para as mulheres. Considerados como ambiciosos, sedentos de dinheiro e apostando no desenvolvimento da sua carreira, existem, contudo, diferenças entre homens e mulheres. Estas últimas elegem o dinheiro como a razão principal para se sentirem atraídas por uma empresa e nela quererem continuar, com os seus pares masculinos a elegeram as competências e a carreira como “quase” tão importantes como o salário que recebem. E à medida que o número de licenciadas a entrar na força laboral excede o de homens, e pela primeira vez, as mulheres parecem conhecer os seus direitos e o quão importante é a remuneração que recebem.

Já os millennials (25-34 anos), querem o mesmo, mas um mesmo diferente. Tanto os homens como as mulheres desejam flexibilidade e um trabalho que os desafie, percebendo que têm uma carreira em modo “ultra-maratona” pela frente e que é imprescindível encontrarem o equilíbrio entre trabalho e vida pessoal. Para as mulheres, contudo, e para perseguirem um trabalho desafiante, a flexibilidade é mais do que crucial. Na medida em que continuam a ser elas a fazer o trabalho emocional e não pago em casa, a flexibilidade é crítica para elas e um “nice to have” para eles.

Os pertencentes à geração X (35-54 anos) são os que prezam (ainda) mais a flexibilidade, tanto no que respeita às mulheres como aos homens. Ambos desejam um início e final de dia flexível, a possibilidade de trabalharem remotamente e, para os que têm filhos, não prescindem da sua licença parental. Com 52 milhões de pais e mães trabalhadores nos Estados Unidos, a juntar a 65,4 milhões de agregados com filhos na Europa e com os cuidados com os mais velhos a aumentarem, a flexibilidade é por demais valiosa para esta geração.

Para a geração mais velha da força laboral, os boomers (55-64 anos e mais de 65) e apesar de também eles elegerem o salário, o desafio do trabalho e a flexibilidade como as principais regalias da sua carreira, a liderança e as equipas ocupam igualmente uma posição prioritária. Ou seja, o empregador e as pessoas com quem trabalha importam e muito. Por outro lado, os trabalhadores mais velhos movem-se mais pelo propósito, não conferindo grande importância à aprendizagem de novas competências. De acordo com o inquérito do ManpowerGroup, os boomers querem crescer como indivíduos e não apenas enquanto empregados. E os empregadores precisam de diversificar e segmentar as suas estratégias de aprendizagem para os convencerem a trabalhar mais e até mais tarde.


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