Empenhados em contribuir para um mundo mais sustentável e inteligente, no que à mobilidade diz respeito, os estudantes universitários europeus aceitaram o desafio de antecipar o futuro, numa iniciativa proposta pela Think Young e pela GoodYear. Prevenir e resolver alguns dos problemas que a sociedade terá de enfrentar “até” 2025 foi o principal objectivo deste concurso, que conta já com três finalistas. Adicionalmente, ambas as entidades promoveram também um estudo sobre o que pensam os millenials sobre o futuro da mobilidade, de importância extrema para as marcas, e com algumas respostas mais conservadoras do que se poderia pensar
POR
MÁRIA POMBO

Não é novidade que as tecnologias vieram alterar, um pouco por todo o mundo, o conceito de mobilidade: os níveis de segurança aumentaram, todos os dias são “inventadas” novas funcionalidades e trocar de carro como se troca de telemóvel é quase um desporto nacional, pelo menos para os que não resistem a exibicionismos desta natureza. Por outro lado, a flexibilização dos horários de trabalho, a “moda” vestida de necessidade para os casais que são “obrigados a ter dois carros”, o incremento do número de famílias monoparentais e uma resposta supostamente inadequada por parte dos transportes públicos para que se escolha a sua utilização em detrimento do veículo próprio são factores que estão a contribuir para o fenómeno “um único ocupante por viatura”. No final, tudo isto acaba por influenciar substancialmente o número de viaturas a circular, o que se traduz também em mais emissões poluentes originárias do necessário aumento do consumo de combustíveis.

Adicionalmente, se pensarmos no expectável aumento populacional e no necessário crescimento económico, e tendo em conta que os transportes são uma chave importante para o bom funcionamento dos centros urbanos e da sociedade em geral, espera-se que as necessidades de mobilidade já sentidas em algumas cidades aumentem e se tornem num problema com impactos ainda mais negativos nos próximos anos. Isto, obviamente, se nada for feito para ultrapassar os obstáculos e lidar com os desafios impostos por esta tendência. É neste contexto que, um pouco por toda a parte, têm vindo a ser procuradas e desenvolvidas estratégias inteligentes que tornem a mobilidade (principalmente nas cidades) mais eficiente, de modo a antecipar os desafios que “o futuro nos reserva”.

Com base nesta premissa e no âmbito do concurso Think Good Mobility, os estudantes universitários europeus foram convidados a “antecipar o futuro”, resolvendo ou prevenindo alguns dos seus problemas. Este desafio foi feito pela Think Young, um think tank dirigido exclusivamente aos jovens, e pela GoodYear, a famosa e mais do que centenária empresa de pneus, que sempre apostou na inovação e cujos produtos se destacam em termos tecnológicos e de desempenho.

Entre Outubro de 2015 e Março do presente ano, os estudantes analisaram e partilharam formas inovadoras de superar, em 2025, os desafios em termos de mobilidade – como o aumento da poluição, o congestionamento rodoviário, o crescimento populacional, a segurança e a sustentabilidade do planeta – que farão parte, segundo se espera, do dia-a-dia de diversas cidades. Dar voz a quem irá, nos próximos anos, enfrentar os maiores desafios em termos de mobilidade, principalmente nos centros urbanos, é o motivo que justifica a opção por este segmento populacional. De acordo com os promotores desta iniciativa, o desenvolvimento e a melhoria da mobilidade terão um impacto bastante significativo e positivo na vida dos jovens e na sociedade em geral.

Sem necessitarem de ter conhecimentos de engenharia, tecnologia ou qualquer outra área específica, os jovens a concurso tinham apenas que ter entre 18 e 30 anos e pertencer a uma universidade da Europa a 28. Estimular a geração millennial a apresentar ideias inteligentes que facilitem a ida de um lugar para outro de forma fácil e rápida (enquadrando-se na categoria Smart mobility) ou que permitam fazer essa deslocação de uma forma eco-friendly (na categoria Sustainable mobility) é o principal objectivo deste desafio. Originalidade, viabilidade, impacto e criatividade são os critérios a ter em conta pelo júri.

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Por uma mobilidade mais smart e sustentável

No concurso, participaram 73 estudantes com ideias criativas e inovadoras, demonstrando um enorme potencial para criar sistemas flexíveis de transporte, aplicações inteligentes, sistemas de mobilidade virtual e gestão sustentável dos centros urbanos. Entre os projectos a concurso, já foram eleitos os três melhores que irão competir pelo prémio final – uma viagem a Silicon Valley, na Califórnia, na qual terão a oportunidade de visitar locais icónicos como o centro de investigação da NASA, a Universidade de Stanford ou as instalações da Tesla – e cujo vencedor será anunciado no próximo dia 23 de Maio.

Jacopo Runchi, da Itália, Artur Zabcazyk, da Polónia, e Siddartha Khastgir, do Reino Unido, são os estudantes que, de acordo com o júri, apresentaram os melhores projectos, tendo por esse motivo sido eleitos para o Top 3. Após aconselhamento com peritos de diversas áreas e nacionalidades e com o objectivo de transformar as suas ideias em negócios viáveis, estes jovens irão apresentar novamente os seus projectos. Um deles será o grande vencedor desta edição.

[quote_center]O vencedor do concurso Think Good Mobility será anunciado no próximo dia 23 de Maio[/quote_center]

Estudante na Universita degli Studi di Bergamo, o italiano Jacopo Runchi apresentou um projecto inserido na categoria “Sustainable mobility”, denominado de Veículo Modular “Linkável” a 2 ou 4 rodas: trata-se de um veículo modular, que tem apenas “um esqueleto” dois lugares e duas rodas e que é alimentado por um motor eléctrico ecológico. Todavia, a este módulo pode ser acrescentado um outro, com mais duas rodas, com o objectivo de resultar numa “fusão” de veículos e transformar-se num “carro normal de quatro rodas”.

Por seu turno, o polaco Artur Zabcazyk apresentou um Sistema de Recuperação de Energia Distribuída, um projecto que se enquadra na categoria Smart mobility e que tem duas fases: a primeira, e como o nome indica, está relacionada com um sistema que permite a recuperação de energia distribuída pelos veículos, e a segunda trata-se de uma base de dados que permite processar e gerir toda a informação relativamente à primeira, em tempo real e a partir de diversas fontes.

No Reino Unido, surgiu a ideia a Siddartha Khastgir, denominada de SASS City Concept (Smart Affordable Safe and Sustainable) que, em tradução livre, significa Conceito Urbano Inteligente, Económico, Seguro e Sustentável. Tal como a invenção anterior, esta ideia faz parte da categoria Smart mobility e tem por base três aspectos: o primeiro trata-se de créditos inteligentes (smart credits) que os utilizadores podem ganhar consoante o tipo de viagem que escolham fazer; através de uma “porta de acesso”, os proprietários dos veículos adeptos deste sistema acedem à informação sobre os smart credits já angariados; por último, cada cidade terá uma zona “inteligente” com uma rede central à qual todos os veículos que estão nessa área e que partilham estas mesmas funcionalidades em particular se poderão “ligar”.

Estes três projectos são apenas uma pequena amostra do que os jovens universitários estão dispostos a fazer, revelando que “não pretendem ser vistos como a geração que nada fez” e demonstrando a sua posição “a favor do uso das tecnologias que respeitam o meio ambiente e a segurança inteligente”, como comenta Carlos Cipollitti, director-geral do Centro de Inovação da GoodYear, no Luxemburgo.

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Jovens querem o melhor de vários mundos

Estas conclusões a respeito dos jovens vão, aliás, ao encontro das principais conclusões do estudo Think Good Mobility, produzido também pela Think Young e pela GoodYear. Com o objectivo de analisar a visão dos millennials sobre o futuro da mobilidade na Europa, este documento teve origem num inquérito realizado, entre Maio e Junho de 2015, a estudantes universitários entre os 18 e os 30 anos e residentes em 12 países do Velho Continente.

No estudo em causa, os jovens demonstram um grande interesse relativamente ao desenvolvimento de veículos seguros, sustentáveis e acessíveis, revelando que as suas maiores preocupações estão relacionadas com questões ambientais e económicas. Entre mais de 2500 inquiridos, 85% pretendem adquirir uma viatura própria na próxima década, esperando que esta seja uma forma de satisfazer as suas necessidades de mobilidade, sendo importante que a mesma tenha um preço justo, não ponha em risco a sua segurança e não prejudique o ambiente.

[quote_center]85% dos jovens pretendem adquirir uma viatura própria na próxima década[/quote_center]

No fundo, os millennials imaginam um futuro onde possam beneficiar do melhor de diversos mundos: ter mobilidade e liberdade, mas sem prejudicar o ambiente e a “carteira”. Contribuir para melhorar a eficiência energética e diminuir as emissões de CO2, não só em veículos “pessoais” mas também em transportes públicos, é uma das prioridades destes jovens.

Uma das formas mais sugeridas pelos inquiridos neste estudo para concretizar este desejo é através do desenvolvimento de carros eléctricos e de mecanismos que permitam baixar o consumo de combustível dos veículos. Deste modo, e mostrando-se abertos a estratégias que revelem ser uma alternativa ao uso do carro convencional, os jovens apostam na combinação entre a tecnologia inteligente e a sustentabilidade, as quais facilitam a criação de apps que incentivem, por exemplo, o car-sharing (bastante popular entre os elementos desta geração) ou outras formas sustentáveis de mobilidade.

As normas governamentais são vistas como uma ferramenta crucial para alcançar a mobilidade sustentável. No entanto, não existe consenso relativamente à matéria sobre as quais estas devem incidir: 44,6% dos inquiridos revelam que as mesmas devem regulamentar as emissões de CO2, 35,7% entendem que, através destas, devem ser dados incentivos a quem opta por usar carros de baixo consumo de combustível, e 34,2% entendem que devem ser dados incentivos a quem opta por usar transportes públicos.

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Mobilidade sim, mas só se for segura, sustentável e acessível

Relativamente aos desafios impostos à indústria automóvel em 2025, os carros inteligentes com elevados recursos de conectividade foram a quarta opção, a qual foi escolhida por apenas 31,5% dos jovens. No entanto, mais de metade (55,7%) dos respondentes revelou a sua preferência por veículos a preços acessíveis e capazes de suportar as tecnologias mais recentes, e quase 60% consideram que preferem um carro que suporte o uso de tecnologia e seja amigo do ambiente. Neste sentido, e uma vez mais, é possível concluir que os jovens entre os 18 e os 30 anos são adeptos de tecnologia, desde que esta satisfaça as suas necessidades e não prejudique o planeta.

Tendo em conta a elevada importância que os millennials revelam dar à segurança, os veículos autónomos – os que “andam sozinhos” – não são muito populares: 40% dos jovens preferem níveis básicos de autonomia, como os sistemas de controlo automático de velocidade ou os já massificados sistemas de travagem anti-bloqueio (ABS), sendo apenas 33% aqueles que confiam neste tipo de veículos. A falta de confiança, de segurança e de privacidade, bem como o custo, são os principais obstáculos apontados pelos inquiridos no que respeita à total autonomia dos automóveis e que justificam o seu “desagrado” relativamente à mesma. No entanto, esta não é uma matéria tabu: de modo a poderem usufruir de viagens livres de medo e tensão, os jovens assumem ter interesse no desenvolvimento de veículos autónomos, revelando estar empenhados em garantir a segurança dos mesmos.

[quote_center]Apenas 33% dos jovens afirmam confiar nos veículos autónomos[/quote_center]

Complementarmente, ao baixo custo, à sustentabilidade e à segurança, junta-se a questão da personalização. Vivendo num mundo dominado por máquinas e cujos produtos são concebidos essencialmente em série, estes jovens revelam um grande interesse em ser tratados como seres humanos únicos e sonham com experiências e objectos à sua medida. Neste sentido, entre os respondentes que pretendem adquirir um veículo nos próximos 10 anos, 81,6% assumem o desejo de o personalizar. Adaptações em termos de emissões de carbono, relativamente ao consumo de combustível, bem como a concepção de veículos adaptados ao tipo de terreno, ao estilo de condução e às condições climatéricas de determinado local, são as principais ideias de personalização apontadas pelos jovens.

Entre as demais conclusões, este documento deixa claro que promover a sustentabilidade ambiental deve continuar a ser um dos principais objectivos a ter em conta nos próximos anos. No entanto, a mesma só será verdadeiramente alcançada se existir um trabalho conjunto de diversas partes, começando por parcerias estreitas entre a indústria automóvel e a tecnológica e culminando na colaboração com os governos e com as pessoas no geral, minimizando o impacto ambiental dos transportes.

Adicionalmente, o estudo salienta que os jovens millennial estão dispostos a abraçar a tecnologia inteligente em áreas como a sustentabilidade e a segurança, mas não de forma desmedida em todas as matérias onde a mesma poderá actuar. Apesar de tudo, o mesmo documento refere também que, se nos distanciarmos dos problemas relacionados com a inteligência artificial e que justificam os elevados níveis de desconfiança, por parte dos jovens, na mesma (nomeadamente no que respeita à produção e utilização de carros conectados, automáticos e que quase prescindem do controlo humano), a tecnologia inteligente consiste num recurso bastante vantajoso. Para além de ter a capacidade de transmitir informações relativamente ao desgaste ou à avaria de algumas peças do veículo, prevenindo acidentes e promovendo a segurança dos veículos, a tecnologia inteligente permite fazer escolhas mais acertadas e rápidas (acerca do trânsito, por exemplo), ajudando a sociedade a beneficiar de uma mobilidade mais sustentável, segura e viável.

Jornalista