Tem como objectivo facultar a jovens vulneráveis a estabilidade necessária que lhes permita sair das ruas e, em simultâneo, ajudar as empresas a melhorar os seus processos de recrutamento fazendo corresponder as suas necessidades a uma pool de jovens talentosos e motivados. A HireUp é um negócio social lançado pela Impakt, uma B Corp canadiana e cujo CEO e fundador “confessa”, num artigo publicado na Stanford Social Innovation Review, alguns erros cometidos e consequentes lições aprendidas
© Stanford Social innovation Review
Adaptado por 
HELENA OLIVEIRA

“Não é a mesma coisa que abrir uma fábrica de calçado”. É assim que Cameron Voyame – o primeiro empregado da HireUp e alguém que, actualmente, está em situação de sem abrigo – descreve os desafios deste portal de emprego que faz a ligação entre jovens vulneráveis e empregos com significado e estáveis.

Como conta Paul Klein, que assina este artigo, em Novembro de 2015, e com o apoio da Home Depot Canada Foundation e a Workopolis, a Impakt, uma B Corp canadiana da qual é CEO e fundador e que tem como objectivo ajudar as empresas e as organizações sem fins lucrativos a adicionarem lucro à inovação social, a HireUp foi lançada. O seu objectivo é o de facultar a jovens sem-abrigo a estabilidade necessária que lhes permita sair das ruas e, em simultâneo, ajudar as empresas a melhorarem os seus processos de recrutamento fazendo corresponder as suas necessidades a uma pool de jovens talentosos e motivados. Agora e mais de um ano passado sobre o seu lançamento, conta Klein, a sua ambição é a de construir um sistema de mudança social, inovador e a nível nacional que utilize as tecnologias para ligar múltiplos empregadores a mais de 36 organizações em todo o Canadá, as quais têm como missão prepararem estes jovens para a sua entrada na força de trabalho.

Esta ambição surge numa altura em que o relacionamento entre as empresas e a mudança social está a passar por uma crise existencial. Por um lado, a sensibilização para as desigualdades sociais nunca foi tão grande, sendo a mudança social uma elevada prioridade, em particular entre os millennials. Por outro, e apesar da evolução das abordagens empresariais de que são exemplo a cidadania corporativa, o investimento na comunidade, o valor partilhado, a responsabilidade social e a sustentabilidade, muitos poderão argumentar que o verdadeiro progresso no que respeita a resultados tanto em termos de negócio como sociais tem-se mantido ilusório.

© HireUp

Será apropriado que uma empresa colha benefícios da mudança social? Será que o facto de simplesmente se estar “no negócio” constitui o melhor estímulo para a mudança social? E o que é que vem primeiro? Apesar da visão extraordinária de empresas como a Unilever, a qual teve coragem de declarar de que “não existe um business case sólido para a pobreza” e do facto de que a esmagadora maioria de todos os empreendedores sociais utilizar a maior parte dos lucros das suas organizações para levarem mais além os seus objectivos sociais ou ambientais, a maioria das empresas dá preferência a uma abordagem de baixo risco e incremental que acaba por se mostrar débil em termos de resultados reais.

Tendo em conta este contexto, a HireUp “mapeou” as possibilidades e os desafios que vão ocorrendo quando se combina abordagens públicas e privadas com vista à criação de soluções inovadoras para problemas sociais. E, como refere Paul Klein, talvez o que tenha assumido uma maior importância tenha sido o facto de todas os pressupostos que a HireUp tomou como certos há um ano no que respeita à capacidade dos parceiros comunitários, às prioridades dos jovens, à estrutura legal e à capacidade de envolvimento do sector privado neste projecto em particular se terem mostrado incorrectos. Klein afirma também que um dos grandes benefícios desta experiência foi o facto de perceber o que é necessário para estabelecer um negócio social com uma “pegada” nacional e o que é realmente crucial para se vir a ser bem-sucedido. Eis a sua lista de “erros transformados em lições”:

Às organizações sociais falta-lhes capacidade. No início, conta, acreditavam que as organizações sem fins lucrativos parceiras possuíam os recursos necessários para assegurar que estes jovens vulneráveis teriam a formação e o apoio necessários para assegurarem e manterem os seus empregos. Mas e na verdade, a maioria delas não se podia dar ao luxo de ir para além do fundamental (ou básico) – fornecendo programas de ajuda à formulação de currículos ou assegurando que os jovens visitavam feiras de emprego. Neste momento, a HireUp está a começar a abordar esta necessidade através do estabelecimento de gestores regionais que consigam ajudar estas organizações a fornecer serviços melhores e mais personalizados, avaliando as necessidades locais, regionais e nacionais dos empregadores e encorajando os jovens a candidatarem-se aos lugares que mais lhes interessem.

Os jovens querem empregos com significado. Também no início do projecto, Klein e a sua equipa partiram do princípio que estes jovens, e na medida em que todos tinham vivido como sem-abrigo, ficariam felizes se encontrassem um emprego qualquer, independentemente da sua natureza. Mas e pelo contrário, o que a equipa de Paul Klein aprendeu foi que estes jovens têm, muitas vezes, interesses muito específicos – como por exemplo as artes criativas ou o trabalho social – mas não têm acesso a programas de formação adequada nessas mesmas áreas. O plano da HireUp é continuar a identificar o que mais interessa tanto para os jovens, como para os empregadores e desenvolver novos programas de aprendizagem e “credenciais customizadas” para diferentes sectores de negócios (como os serviços financeiros, o retalho ou as indústrias criativas). O fundador da HireUp afirma que todos trabalharão para a implementação destes programas, os quais serão disponibilizados na sua plataforma online.

Alguns empreendimentos sociais exigem estruturas complexas. Klein declara também que a HireUp ambicionava operar como um negócio social, na medida em que a sua ideia original seria a de fornecer um serviço com valor aos empregadores. Por outro lado, acreditavam também que o modelo em causa iria demonstrar que os jovens vulneráveis tinham, como quaisquer outros, o seu próprio valor. Contudo, e porque a HireUp não é uma organização de caridade, não possuía as qualificações necessárias para se financiar a partir de fundações privadas ou para se candidatar a programas governamentais. Por outro lado, afirma também Klein, é ainda muito cedo para a mesma ser sustentável, pois as suas receitas derivam unicamente do pagamento de uma comissão por parte dos empregadores que utilizarem a sua plataforma, tendo sido a própria Impakt a providenciar o seu financiamento. Klein confessa que só agora foi reconhecida a necessidade de enveredarem por uma abordagem híbrida. O plano é operar enquanto uma estrutura com fins lucrativos que possa gerar retorno para os seus investidores e, em paralelo, enquanto organização sem fins lucrativos (a HireUp Learning) para que possa ir ao encontro dos requisitos exigidos por fundações privadas e programas governamentais.

A um nível mais amplo, e de acordo com Klein, são necessárias novas regulamentações financeiras e programas que ajudem os negócios sociais a “descolarem”, como por exemplo, permitindo que as fundações privadas possam alocar uma parte do seu financiamento para este tipo de empreendimentos, introduzindo “garantias soberanas” apoiadas pelos governos que reduzam o risco dos investidores em negócios sociais, e que possam apoiar e proteger as mesmas quando estas não são viáveis ou estabelecer um novo financiamento nacional que ajude a capitalizar as empresas com propósitos sociais.

O sector privado está a abraçar a inovação social. Klein e a sua equipa esperavam que o maior desafio que enfrentariam seria o de convencerem os empregadores a contratar jovens que tivessem vivido em situações de vulnerabilidade, neste caso sem-abrigo, tal como fariam com qualquer outra pessoa. Mas o que acabaram por descobrir foi que as empresas – incluindo a Home Depot Canada, o Scotiabank, a Starbucks, o TD Bank, a Nordstrom, a NEI Investments, a Walmart Canada, a Peak Products, o First Service Residential e a Maple Leaf Foods – estão ansiosas por contratar este tipo de jovens, Os empregadores da HireUp estão comprometidos com a contratação inclusiva e com a diversidade e reconhecem que estes jovens têm todas as condições para serem empregados capazes e leais. Klein assegura que a ideia é continuarem a trabalhar de forma estreita com estes empregadores para melhor perceberem as suas necessidades de contratação e assegurar que os novos programas e requalificação fornecidos pela HireUp Learnig resultem em mais contratações.

A ideia subjacente à criação da HireUp foi convincente o suficiente desde o início para segurar dois parceiros fortes, para gerar uma substancial cobertura dos media e para sobreviver ao seu primeiro ano. Mas Klein admite que não tinham um plano claro sobre de que forma é que o negócio poderia evoluir. E parece natural que se argumente que a complexidade da questão tornaria algumas das mais importantes questões de negócios impossíveis de responder. Qual seria a estrutura legal ideal? Quanto capital seria necessário? Qual seria a melhor estrutura de pricing? Como se avaliaria o seu sucesso?

Assim, o conselho de Klein para outros empreendedores sociais tem como base aquilo que aprendeu ao longo do último ano – o mais excitante e difícil de toda a sua vida. E se pudesse começar de novo, eis o que faria:

  • Assegurar que existe uma ideia clara de como criar emprego para jovens vulneráveis que possa também gerar lucro;
  • Não existir pressa para a criação de uma “pegada” nacional. Se a HireUp tivesse começado em um ou dois mercados-piloto, teriam aprendido o que deveriam ter feito de diferente muito mais rapidamente e poupado dinheiro;
  • Nunca colocar fundos próprios nos aspectos relacionados com a mudança social [promovida pela HireUp]. Uma coisa é investir em algo em que existe a possibilidade de um retorno, mas financiar uma mudança social pura poderia ter levado a Impakt à falência. Ao invés, Klein afirma que teria optado por procurar apoios governamentais ou fundações que pudessem apoiar o projecto;
  • Ter uma estratégia de saída clara. Nunca foi intenção de Klein manter a HireUp por baixo do chapéu da Impakt, mas a verdade é que esta decisão não estava suficientemente clarificada em termos do que poderia acontecer.

Mas e apesar de muitos erros, Klein afirma estarem confiantes que conseguirão oferecer uma mudança social com significado e gerar lucro ao fazê-lo. E, depois de tudo isto, Cameron está certo: um negócio social é muito mais complexo do que abrir uma fábrica de sapatos – mas esse não é um motivo suficiente para perder a esperança.

Adaptado, com permissão, de Bringing Together Business and Social Change: Not for the Faint of Heart © Stanford Social Innovation Review 2016.

Helena Oliveira

Editora Executiva