Para António Pires de Lima, “é muito mais fácil fazer uma moção para salvar a pátria do que falar sobre o amor, nomeadamente o amor como critério de gestão”. O convidado do último Almoço-Debate promovido no âmbito do ciclo de conferências da ACEGE acredita que mesmo num universo de extrema competição, a empresa pode ser um espaço de realização para as pessoas, embora algumas não sejam
POR SÓNIA BEXIGA*

A Associação Cristã de Empresários e Gestores (ACEGE), no âmbito do ciclo de conferências 2012/2013 subordinadas ao tema “O Amor como critério de gestão”, estendeu, desta vez, o convite ao gestor António Pires de Lima.

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António Pires de Lima, Gestor
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Para Pires de Lima, “é muito mais fácil fazer uma moção para salvar a pátria do que falar sobre o amor, nomeadamente o amor como critério de gestão”. Assumindo não pretender falar como “um modelo de gestor, uma espécie de referência, um praticante do amor” nas empresas por onde passou, principiou salientando que toda a vida trabalhou num modelo de grande competitividade, em mercado aberto, na indústria de produtos de consumo, vivendo a experiência de relação directa, de frontalidade, em equipa. Acreditando, por isso, que, no final, a empresa, mesmo num universo de extrema competição, pode ser um espaço de realização para as pessoas, embora algumas não sejam.

“Este tema obrigou-me a olhar para o que tem sido o meu percurso em termos profissionais e, hoje, são muitas as inquietações e as dúvidas. São mais as dúvidas do que as certezas que tenho relativamente àquilo que tenho feito e até sobre o modelo em que estou inserido e sirvo, porque o universo do trabalho é extraordinariamente competitivo, com as empresas expostas a uma espécie de darwinismo social. E as coisas pioraram ou tornaram-se mais complicadas a partir do momento em que entrámos nesta onda da globalização, onde as nossas empresas objectivamente estão a competir com outros modelos que têm outras regras de funcionamento e têm outro olhar até sobre os direitos”, afirma.

E, com este cenário, o empresário afirma ter “muitas dúvidas se a competitividade que temos de defender para as nossas empresas é sempre compatível com o tratar as pessoas com justiça, com humanidade. Se o capitalismo tem evidenciado (nomeadamente nos últimos vinte anos, desde que deixou de ser um contraponto como um sistema) que promove a igualdade, a equidade e, até, se a própria democracia burguesa ocidental é um registo que tem sabido defender a sustentabilidade, a eternidade, daquilo que é a bondade humana e os direitos das pessoas na vida em comunidade” – concluiu.

A experiência ensinou-lhe que, de facto, as empresas podem ser um espaço especial de realização humana. No seu percurso, sempre exposto a grande concorrência, as empresas onde trabalhou, por escolha, são empresas de produtos de consumo e, por isso, têm o seu foco dirigido aos consumidores e clientes.

Então, o primeiro acto, que considera “muito positivo”, passa por “um conjunto de pessoas, obviamente com objectivos de alcançar lucros e servir os interesses dos accionistas, se organizar para ser útil, porque ninguém escolhe os nossos produtos se eles não tiverem uma utilidade superior à que é apresentada pela concorrência. E, no final, uma empresa sujeita a um registo de grande concorrência, como aquela em que trabalho e nas que trabalhei, tem a obrigação de demonstrar diariamente a sua utilidade”.

“Tenho muitas dúvidas se a democracia burguesa ocidental é um registo que tem sabido defender a sustentabilidade daquilo que são os direitos das pessoas na vida em comunidade” .
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Acrescentando tratar-se de “um projecto e uma missão de humildade, porque acabamos por ser escolhidos, ou não, pelas pessoas que queremos atingir. E o próprio espaço de uma empresa que queira servir os outros significa, já de si, um desafio. Obriga não só a sair do universo de conforto, mas também a juntar-se para servir os outros em nome de um interesse comum, pondo de lado egoísmos, egos e vaidades”.

Pires de Lima sente que os projectos por onde passou têm procurado ser, com contributo de todos e dependendo muito da cultura dos accionistas, um espaço de realização, crescimento e valorização das pessoas. “E acabam, muitas vezes, por dar um sentido especial à vida das pessoas. A verdade é que uma pessoa sem trabalho está obliterada de uma parte da sua dignidade e não é totalmente pessoa (pelo menos se quiser trabalhar)”, sublinhou. Neste sentido, defende a tese de que “dificilmente se cria valor para os outros se, de forma recorrente, não criarmos valor para nós próprios, se não gostarmos do que fazemos, se não nos sentirmos bem na empresa em que trabalhamos”, frisa Pires de Lima.

Seguido e não “apenas” obedecido
Trabalhar em equipa e conseguir estar diariamente disponível para ouvir é, na opinião do orador, a característica mais importante para se liderar e ser-se reconhecido como líder. “E também não há nada mais desafiante, exigente e às vezes difícil, num ambiente de cultura das vaidades, do que abdicar do ego para reconhecer aos outros aquilo que fazem, as ideias que têm, mesmo quando vão contra as nossas e, acima de tudo, pôr a nossa vontade ao serviço da equipa. Acredito que o valor de uma empresa sustentável que não dependa de uma só figura está em construir uma boa equipa”.

Pires de Lima entende o Amor como sendo o serviço, também em funções de liderança. Na sua opinião, em Portugal, e em estruturas da Europa do sul, “confunde-se liderança com estatuto e poder, e nem sempre se encara esta como uma responsabilidade de servir, mais do que todos os outros que trabalham na nossa empresa. A cultura hierárquica, formalista que se vive nas empresas em Portugal é um reflexo deste tipo de cultura”.

Trabalhar em equipa e conseguir estar diariamente disponível para ouvir é a característica mais importante para liderar se ser reconhecido como líder .
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Admitindo que “todos temos o nosso ego” e “sem pretensão de dar lições”, considera que “a vontade e o ego têm de dar lugar, fundamentalmente, a este serviço que é liderar e que passa, em primeiro lugar (é uma coisa que aprendi em minha casa), pela necessidade de dar o exemplo, todos os dias. Mais do que falar sobre aquilo que faço, é olhar realmente para aquilo que fiz”.

Considerando que, para um líder, é importante estabelecer uma missão, definir uma estratégia, alinhar interesses e objectivos, “é também muito importante estimular e motivar as pessoas. Mas se a nossa liderança não for um exemplo para as pessoas, é muito difícil ou impossível ser-se líder. Ser-se obedecido é muito diferente de ser-se seguido” – conclui.

Momentos Dolorosos
Há cerca de doze anos que, na perspectiva de Pires de Lima, as reestruturações das empresas têm sido quase uma espécie de lei fundamental para assegurar a sua sustentabilidade.

Actualmente, a Unicer tem uma equipa de 1500 trabalhadores, mas, quando Pires de Lima a assumiu, eram aproximadamente 2400. “Se calhar, é preciso ter alguma lata para estar a falar de amor quando se liderou um processo de reestruturação como este. E já na Compal passei por algo parecido, onde tive de avançar com uma redução de 30 a 40% da equipa, porque senão não conseguiríamos competir.

Mas diz-me a experiência mais recente que, quando a visão que temos para o futuro da empresa é correcta e as pessoas percebem que é aquilo que tem e deve ser feito; quando é explicado não por documentos escritos ou por jornais internos, mas dando a cara a cada um dos colaboradores e dando até a oportunidade de sermos criticados e comentados pelas pessoas com quem trabalhamos directa e indirectamente; quando procuramos, no meio das dificuldades, actuar com critérios que são vistos pelos outros como transparentes, de equidade e justiça, as coisas têm uma alta probabilidade de correr bem”.

Hoje, Pires de Lima confessa ter muito mais dúvidas do que quando saiu da universidade, relativamente “à bondade do sistema que servimos”. “O capitalismo em que vivemos tem sido muitas vezes exemplo de falta de humanismo e não tem sido, nas últimas décadas, factor de correcção de desequilíbrios; o exercício pragmático da procura do lucro trimestral servindo os mercados, às vezes, faz as empresas verdadeiramente máquinas desumanas de gestão, mas também acho que o futuro das empresas (sobretudo as familiares) depende muito daquilo que cada um de nós aporte com noção de serviço. Não sabendo se este meu exemplo é transponível para a política, é na criação e gestão de empresas que a vida me tem proporcionado momentos de maior realização e de construção pessoal e colectiva”.

*A versão original deste artigo foi publicada na edição de 27 de Junho do Jornal OJE

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