Embora mais empresas estejam preocupadas em serem organizações felizes (fundamental para captar e reter talento, e aumentar a produtividade) uma grande parte delas não tem ainda uma visão estratégica sobre este tema. Ser uma organização feliz obriga a implementar uma cultura de felicidade organizacional e trabalhar, estrategicamente, cada um dos fatores e variáveis que lhe dão origem. Esta é uma das conclusões da mais recente edição do estudo “Happiness Works”, o qual tem como missão medir a felicidade organizacional e a sua relação com produtividade
POR GEORG DUTSCHKE

O projeto Happiness Works, realizado em Portugal desde 2011, tem como parceiros a Lukkap Portugal, Atlântica, EXAME, Associação Portuguesa de Gestão de Pessoas (APG), Associação Cristã de Empresários e Gestores (ACEGE) e Sociedade Rebelo de Sousa Advogados. No acumulado, conta com a participação de 21.000 profissionais e mais de 300 organizações.

O Happiness Works tem como missão medir a felicidade organizacional e a sua relação com produtividade. Saber como ter colaboradores felizes é fundamental para o sucesso das organizações. Está provado que colaboradores felizes são mais produtivos e, desta forma, organizações com colaboradores mais felizes conseguem melhores resultados e são mais sustentáveis. Por esta razão, o estudo da felicidade organizacional teve um grande desenvolvimento a partir do ano 2000, sendo atualmente suportado por muitos estudos académicos e procurado pelas empresas.

Em 2019 recebemos 5.100 respostas, válidas, de profissionais de 219 empresas. Foi o ano com maior participação de profissionais e empresas, o que demonstra o crescente interesse por este tema.

Tendo como base os resultados do estudo HW 2019 em Portugal, é possível validar a relação entre colaboradores mais felizes e mais produtividade (Tabela 1).

Tabela 1. Colaboradores Felizes vs Não felizes. Impacto na produtividade.

Da análise da Tabela 1. é possível verificar que colaboradores felizes faltam menos 64,8%, têm menos 43,2% vontade de mudar de organização, sentem-se 10,7% mais produtivos, têm uma melhor relação com o chefe (+14,8%), maior abertura à mudança (+16,8%) e maior equilíbrio pessoal (+10%). Estas três últimas métricas foram obtidas através do modelo de saúde mental positiva que este ano avaliámos em simultâneo com o modelo de felicidade organizacional Happiness Works.

O nível de Felicidade Organizacional nos últimos 4 anos é de 3,8 (Gráfico 1), sendo que os profissionais portugueses são “quase felizes” (escala entre 1 e 5). Este nível de Felicidade Organizacional, quando comparado com os anos anteriores (2012 a 2015) reflecte a recuperação económica em Portugal, a maior preocupação das organizações em terem colaboradores felizes, mas, também, uma alteração cultural na forma como os profissionais portugueses encaram a sua vida profissional e pessoal. A insegurança passou a ser uma realidade com que temos de viver e a instabilidade profissional é um facto. Hoje, os profissionais estão muito mais abertos à mudança e risco. Perder um emprego é menos um problema e mais uma oportunidade para recriar a carreira ou iniciar um projeto próprio.

Gráfico 1. Evolução do nível de Felicidade Organizacional em Portugal

No entanto, parece existir uma “estagnação” do nível de felicidade organizacional em Portugal nos 3,8. Embora mais empresas estejam preocupadas em serem organizações felizes (fundamental para captar e reter talento, e aumentar a produtividade) uma grande parte delas não tem uma visão estratégica sobre este tema. Ser uma organização feliz obriga a implementar uma cultura de felicidade organizacional e trabalhar, estrategicamente, cada um dos fatores e variáveis que lhe dão origem. A maioria das empresas em Portugal tem uma grande preocupação em implementar medidas muito táticas (oferecer fruta, ginásio, massagens, …) mas, não promovem, na realidade uma cultura de felicidade organizacional. Enquanto este passo não for dado, dificilmente o nível de felicidade organizacional total poderá crescer.

Algumas organizações incorporaram no seu organigrama a função de “Chief Hapinness Officer”, o que reflecte uma vontade em promover, formalmente, a felicidade nas suas organizações. Mas, em muitas destas empresas, as funções do CHO são apenas táticas. A promoção da felicidade organizacional é uma decisão estratégica que tem de envolver o CEO e uma nova função: Diretor de Pessoas (não Diretor de Recursos Humanos). Apenas quando se gere o colaborador como um todo na sua pessoa, é possível promover a sua felicidade como profissional e desta forma conseguir, realmente, organizações felizes.

Quando analisamos os resultados por sector de atividade (Gráfico 2) verificamos que as empresas de Comunicação e Informação são as que têm colaboradores mais felizes. No sentido inverso, o Estado tem os colaboradores mais infelizes. Em 2019, os profissionais do sector da Saúde e Apoio Social consideram-se infelizes. Tal deve-se, em particular, aos profissionais de enfermagem que, sendo felizes na função que desempenham, se sentem muito infelizes na organização para a qual trabalham.

Gráfico 2. Felicidade Organizacional por sector de atividade.

Desde o início do Happiness Works que os sectores de Comunicação e Informação (3,6 para 4,0) e Indústria (3,3 para 3,9) são os que demonstram um crescimento mais sustentado no nível de felicidade organizacional. São sectores que após os anos de crise económica têm tido um crescimento relevante, mas por razões diferentes. As empresas de comunicação e informação, mais modernas, têm beneficiado do crescimento económico, mas, também do rápido desenvolvimento da tecnologia, que tem originado novas áreas de negócio, muito dinâmicas e inovadoras. É muito motivador e estimulante trabalhar neste sector de atividade onde existem inúmeras hipóteses de carreira. As empresas industriais, mais tradicionais, têm beneficiado do crescimento do consumo interno e das exportações.

O modelo Happiness Works considera nove fatores que contribuem para se ser feliz na organização (Tabela 2) e dez na função (Tabela 3).

Tabela 2. Fatores que contribuem para a felicidade na organização

Tabela 3. Fatores que contribuem para a felicidade na função

Todos os fatores têm uma evolução positiva quando comparamos 2019 com 2012. No entanto, há duas dimensões que mais se distinguem. O Ambiente Interno e Ser Empreendedor. Estas duas dimensões refletem situações distintas. O ‘Ambiente Interno’ reflete a maior preocupação das organizações em ter ambientes que promovam a felicidade organizacional, como parte da sua visão estratégica ou com base em ações mais táticas. O poder ‘Ser Empreendedor’ reflecte, por seu turno, uma nova cultura crescente em Portugal: a preocupação em criar riqueza nas organizações (intraempreendedorismo) ou através de projetos pessoais (empreendedorismo).

Das dimensões analisadas, apenas a remuneração continua a ter um valor negativo de 3,2. No entanto com um crescimento comparativamente a 2012 (de 2,9 para 3,2). Estes valores refletem um possível aumento da remuneração média, mas, também, uma “habituação” em relação ao salário recebido. Depois da perda de poder de compra nos anos anteriores, as famílias reajustaram os seus orçamentos e habituaram-se a viver com a nova realidade. Não estando felizes com a remuneração recebida, pelo menos estão menos infelizes.

Em conjunto com a ACEGE, medimos a relação entre ser um colaborador feliz e existir a possibilidade de conciliar o trabalho e a família. Esta relação é evidente quando a análise é feita por setor de atividade (Gráfico 3). É relevante verificar que os setores com colaboradores mais felizes são também aqueles onde existe uma maior possibilidade de conciliação trabalho família.

Gráfico 3. Nível de conciliação trabalho / família por setor de atividade

(1. Muito baixo;5. Muito alto).

Por fim é interessante comparar a realidade ACEGE com a de Portugal (Tabela 4).

Tabela 4. Acege vs Portugal

Verifica-se que os colaboradores que responderam através da ACEGE, consideram-se mais felizes como profissionais, faltam menos e valorizam mais as medidas de conciliação trabalho / família disponibilizadas pela empresa. Ou seja, são organizações com mais capacidade para atrair e reter talento, logo, mais sustentáveis!

Metodologia Happiness Works

O projeto Happiness Works realiza-se em Portugal desde 2011. Para criar o modelo HW foi, em primeiro lugar, realizada uma revisão bibliográfica, procurando-se trabalhos de investigação realizados em todo o mundo sobre Felicidade Organizacional. Com base na revisão bibliográfica preparámos um guião de entrevista que realizámos junto de 1.000 profissionais em Portugal. Através de análise de conteúdo foi possível identificar as variáveis e factores referidos pelos respondentes que contribuem para a sua felicidade organizacional. Conhecendo as variáveis que contribuem para a felicidade organizacional, foi possível elaborar um primeiro questionário e realizar um estudo quantitativo. Com as respostas obtidas no estudo quantitativo, realizámos uma análise factorial exploratória e confirmatória, aplicando o modelo de equações estruturais. Desta forma, foi possível verificar, estatisticamente, o modelo de felicidade organizacional em Portugal, Happiness Works (HW). Aplicando o modelo de felicidade organizacional HW é possível verificar o nível de felicidade organizacional de profissionais e empresas. Para tal, é avaliado numa escala entre 1 e 5, o nível de felicidade na organização e função, detalhando os factores e variáveis. Avaliamos também o envolvimento e nível de fidelidade (não vontade de sair) dos colaboradores com a organização. Ponderando estas três variáveis, são identificadas as organizações mais felizes.

Georg Dutscke - Partner e fundador Happiness Works