Quando uma autarquia não paga aos seus fornecedores nos prazos acordados, está a contribuir para a redução da actividade económica e para a criação de desemprego na sua região. Exactamente o oposto ao que é ambicionado e prometido
POR SOFIA SANTOS

Na actual campanha autárquica muito se fala, muito se ambiciona. Tudo em prol da conquista dos votos do morador e do empresário local. Tudo em prol do sonho de construir um melhor local de vida e promover a geração de riqueza e postos de trabalho.

Sendo o elevado desemprego um dos principais problemas da economia nacional, que ronda os 16,5% aos dados de hoje a nível nacional, chegando quase aos 40% na população mais jovem, seria de esperar que as mensagens das campanhas autárquicas também enfatizassem a criação de postos de trabalho. E sim, as promessas para o desenvolvimento do território em causa e que este seja capaz de gerar emprego constam dos programas eleitorais, se bem que pouco desenvolvidas.

No entanto, existe algo muito simples e que, isso sim, é capaz de gerar ou destruir emprego local: o pagamento atempado aos fornecedores de bens e serviços às autarquias. Como é do conhecimento público, o Estado português tem “fama” de mau pagador. Na realidade, e de acordo com a Intrum Justitia, o Estado português é dos piores pagadores a nível Europeu.

Este facto acarreta necessariamente implicações ao nível da dinâmica da criação de actividades económicas e, também, ao nível da inovação. Só para termos uma ideia, ao nível estatal, em Dezembro de 2012, as dívidas por pagar com mais de 90 dias ascendiam aos 4,6 mil milhões de euros, o que corresponde a cerca de 3% do PIB, (Execução Orçamental em Contabilidade Pública, 4 Fevereiros 2013. Unidade Técnica de Apoio ao Orçamento)

São valores astronómicos que não estão a ser injectados na economia, e que, acima de tudo, já tiveram despesas associadas, nomeadamente os pagamentos de impostos e salários. Uma sociedade com uma característica desta natureza dificilmente conseguirá prosperar. Um estudo da Augusto Mateus & Associados publicado em 2011, afirmou que, pelo facto de entre 2006 e 2011 o atraso nos pagamentos ter aumentado 12 dias, de 68 para 80 dias, o mesmo implicou uma quebra anual de 14 mil postos de trabalho. Estes números espelham bem as consequências extremas que uma cultura de pagamentos atrasados pode originar na economia. Na realidade e na Europa, cerca de 25% das falências provêm do facto de os clientes não pagarem atempadamente.

Assim sendo, quando uma autarquia não paga aos seus fornecedores nos prazos acordados, está a contribuir para a redução da actividade económica e para a criação de desemprego na sua região. Exactamente o oposto ao que é ambicionado e prometido.

Tendo a Comissão Europeia compreendido este problema, definiu uma directiva com obrigatoriedade de transposição para legislação nacional de todos os Estados-membros, a qual que estabelece como obrigatório os pagamentos serem realizados a fornecedores entre 30 a 60 dias. Esta directiva foi transposta para lei portuguesa em 1 de Junho de 2013, sendo desde então obrigatório que as empresas públicas e outros organismos estatais paguem aos seus fornecedores num período entre 30 a 60 dias, e as empresas privadas até 60 dias. Esta obrigatoriedade está expressa no Decreto-Lei n.º 62/2013, de 10 de Maio. Assim sendo, é obrigatório que as autarquias paguem aos seus fornecedores num prazo entre 30 a 60 dias.

Consultando a lista do prazo médio de pagamento registado por município à data de Dezembro de 2012, é possível verificar que cinco autarquias em Portugal demoram em média mais de três anos a pagar e cerca de 40 demoram entre um a dois anos. No entanto existem algumas boas notícias ao constarmos que aproximadamente 120 municípios têm um prazo médio de pagamentos até 60 dias. É assim urgente que os mais de 200 municípios que têm prazos médios de pagamento superiores a 60 dias, implementem medidas para cumprir com a lei.

No estudo realizado em 2011 pela Augusto Mateus & Associados, concluiu que se todos os agentes privados pagassem aos seus fornecedores a 60 dias, a economia iria ter uma injecção de liquidez que poderia fazer subir o PIB em 3% e gerar cerca de 120,000 postos de trabalho e só no primeiro ano de cumprimento. Imaginemos então se o sector Estado também pagasse 30 ou 60 dias, o crescimento económico que Portugal poderia ter! Estaríamos, com toda a certeza, num crescimento positivo!

Assim sendo, fará todo o sentido que as autarquias se comprometam, também, a pagar a 30 ou 60 dias aos seus fornecedores. Essa é uma promessa que, cumprida, tem impactes directos no emprego regional.

Nota: Consulte a newsletter especial que o VER publicou sobre a cultura de pagamentos pontuais

CEO da Systemic