A todos os profissionais de marketing que pretendam ganhar a batalha dos produtos e serviços “verdes”: esqueçam tudo o que tentaram, porque o fosso entre intenções e acções dos consumidores está longe de ser colmatado! Mudar comportamentos e massificar este movimento, a partir de 12 passos cruciais, é a proposta de um estudo desenvolvido pela OgilvyEarth e que o VER resume
POR HELENA OLIVEIRA

A OgilvyEarth, uma divisão da Ogilvy & Mather dedicada á comunicação holística sobre sustentabilidade, realizou um estudo, nos Estados Unidos e na China, que visa “quebrar o código” de uma dos mais bicudos problemas de marketing da actualidade: o enorme fosso existente entre os valores e as intenções das pessoas relativamente a comportamentos sustentáveis, mas que não são espelhados pelas suas acções: o denominado “Green Gap”. Os dois países foram escolhidos como universo a pesquisar pelo simples facto de representarem os dois maiores mercados de consumo no mundo.

Apresentado no Green Festival por Graceann Bennett, directora de Planeamento Estratégico da Ogilvy & Mather em Chicago, o estudo não só revela os fracassos do marketing da sustentabilidade até agora, como oferece 12 passos valiosos que ajudarão os marketers a “preencher” este fosso entre intenção e acção.

A principal conclusão de “Making Green mainstream: moving sustainability from niche to normal”, pelo menos para os profissionais do marketing,  é a de que grande parte do que tem sido feito até agora para promover comportamentos sustentáveis, está completamente errado.

Dado que 82% dos consumidores têm boas intenções ecológicas mas apenas 16% as cumpre realmente, o estudo deixa claro que promover comportamentos ecológicos exige uma nova e maciça abordagem.
E, na medida em que fechar este gap é um passo urgente para a criação de uma sociedade sustentável, a Ogilvy chama a atenção para alguns das barreiras que têm contribuído igualmente para a sua complexa transposição.

Para além do fracasso claro dos governos em liderarem o caminho para as alterações climáticas (ou para persuadirem as pessoas relativamente à sua importância), as organizações e os negócios estão a demonstrar um vácuo de liderança na medida em que apenas encaram a questão como uma oportunidade financeira e reputacional. Assim, só terão a possibilidade de virem a ser bem-sucedidas se conseguirem resolver as duas questões que se seguem.

Em primeiro lugar, a persistência do green gap quando a questão é o comportamento de compra tornou muito difícil para as empresas, especialmente para aquelas que vendem para o consumidor comum, levarem a cabo um modelo de negócio bem-sucedido relativamente aos seus produtos e serviços verdes. E a oportunidade de negócio só atingirá o seu verdadeiro potencial quando se descobrir a fórmula para fechar este gap. Por outro lado, sem um business case, não existem incentivos para que uma organização se mantenha envolvida.

Em segundo lugar, enquanto a pegada ecológica directa proveniente das operações das empresas é grande e significativa, poderá ser pálida comparativamente ao impacto dos seus produtos em termos da utilização feita pelos consumidores. O estudo em causa dá como exemplo a Unilever e um relatório, publicado o ano passado e intitulado Sustainable Living Plan, no qual a gigantesca empresa estima que uma elevadíssima percentagem (93%) das emissões de carbono ao longo do ciclo de vida de uma dose de champô seja proveniente da utilização por parte do consumidor (principalmente como resultado do aquecimento da água para o banho de chuveiro). E apesar de estar a perseguir continuamente inovações tecnológicas para ir ao encontro desta problemática, a empresa afirma igualmente que é sua prioridade encontrar formas eficazes para trabalhar com os consumidores no sentido de alterarem o seu comportamento, pois “o mais elevado dos ganhos será proveniente da modificação dos seus comportamentos no duche”.

Ou seja e no geral, o estudo identifica como necessidade primordial compreenderem-se e estabelecerem-se as condições sociais necessárias para que as empresas possam ser bem-sucedidas no movimento verde e, mais importante, como este deverá ser programado.

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O estudo da OgilvyEarth teve como base quatro questões por excelência para sustentar a sua premissa inicial de que valores e intenções não espelham as verdadeiras acções:
Quem é verde e quem não é? A população foi segmentada em grupos de “super-verdes” e de “rejeitadores”, para se perceber como a população encara as questões da sustentabilidade. E qual o peso que a idade ou a geografia  têm neste contexto.

O que separa os fazedores dos meros crentes e dos cépticos? O estudo explorou o que estimula algumas pessoas a comportarem-se de forma sustentável e quais as barreiras que impedem a passagem do acreditar para o agir.

E por que existe o gap?
Para fechar o fosso, percebemos de compreender as razões da sua existência – ou seja, o que está a impedir a massificação de um estilo de vida mais sustentável.

Quais os segredos para fechar o gap? Que tipo de coisas poderá levar à mudança de comportamentos de que estamos à procura? De que forma podem as marcas e os marketers explorar algumas destas verdades para promoverem estilos de vida mais sustentáveis? Quais as responsabilidades dos governos e dos legisladores nesta matéria? Qual a importância do estigma social e da culpa versus os rituais e as recompensas? Como é que os nossos desejos pela individualidade podem ir a reboque do nosso desejo pela aceitação social?

Depois de exploradas estas questões, a OgilvyEarth propõe 12 formas para fechar o gap. O VER resume-as de seguida:

1. Tratar a questão com normalidade

O normal é sustentável. E o que é normal estimula a popularidade necessária para um movimento de massas.
De que forma podem as marcas comercializar as suas ofertas de produtos e serviços sustentáveis de uma forma que as faça sentir que é tudo normal? O primeiro princípio: faça as pessoas sentirem que toda a gente está a fazê-lo. Em 2007, e inspirados pelos avançados na área da economia comportamental, Dan Yates e Alex Laskey fundaram a empresa OPOWER que tem como objectivo estabelecer um conjunto de orientações que ajudem os consumidores a adoptarem comportamentos energéticos mais eficazes e tudo com base num princípio simples: “Podemos levar as pessoas a adoptarem este tipo de comportamento mostrando-lhes, simplesmente, aquilo que outras pessoas estão a fazer”. Quando as pessoas percebem que um comportamento positivo é normal e que toda a gente está a segui-lo, é muito fácil aderirem e confiarem nesse comportamento de grupo.

2. Personalizar a questão

Não pergunte o que o consumidor pode fazer pela sustentabilidade; ao invés, pergunte o que a sustentabilidade pode fazer por ele – e demonstre.
Há muito que a OgilvyEarth tem vindo a afirmar que é necessária uma alteração no marketing da sustentabilidade que a transporte dos ursos polares para as pessoas. As mensagens que são pessoais têm um efeito muito mais marcante do que aquelas que são abstractas e remotas. As empresas que conseguirem estabelecer a relação entre os seus produtos e os benefícios pessoais estarão numa posição muito mais confortável para virem a ser bem-sucedidas. A OgilvyErath dá exemplo da bem-sucedida campanha levada a cabo pela Organic Trade Association, e cujo mercado dos produtos orgânicos registou uma subida de 8% em 2010, porque os consumidores perceberam a importância, para a sua própria saúde, de ingerirem alimentos livres de pesticidas e de hormonas sintéticas.

3. Criar defaults melhores

Se o verde for aceite “por defeito”, as pessoas não têm que decidir se o vão adoptar ou não.
Ser verde numa sociedade na qual o verde é uma “anomalia” é difícil, mesmo para as pessoas que estão profundamente enraizadas numa causa. Ser verde significa muitas vezes ser confrontado com escolhas complexas, o que poderá constituir um esforço extenuante para se fazer aquilo que está correcto.
Mas o que acontece se for o marketer a fazer o trabalho difícil? A retalhista IKEA começou a cobrar pelos seus sacos em plástico em 2006, banindo-os até em alguns mercados em 2008. O resultado: a esmagadora maioria dos clientes nunca se esquece de levar o seu saco reutilizável quando visita as lojas da famosa retalhista.

4. Eliminar o imposto da sustentabilidade

O imposto sobre o pecado é uma coisa, mas os consumidores não deveriam ter que pagar um imposto devido ao seu comportamento virtuoso.
Os governos têm por hábito utilizar os impostos para alterar comportamentos. Por exemplo, na sua luta para diminuir o número de fumadores, cobram pesados impostos sobre o tabaco. Na Rússia e em outros países com baixas taxas de natalidade, os governantes estão a encorajar a procriação com a oferta de redução de impostos para aqueles que pretendem colocar crianças no mundo (e futuros contribuintes).
No mercado dos produtos verdes, é o incentivo oposto que vigora. No fundo, taxam-se as pessoas que possuem comportamentos virtuosos. O preço elevado da esmagadora maioria dos produtos verdes sugere que se está a a tentar limitar ou a desencorajar escolhas mais sustentáveis.

Se a barreira do preço for eliminada, o mesmo acontecerá com a ideia de que este tipo de produtos não serve para o cidadão “normal” e que estes não são produzidos apenas para os ricos ou para os que os “merecem”.

5. Subornar sem vergonha

Estrelas douradas, dinheiro, fama ou presentes – todos adoramos ser recompensados pelo nosso bom comportamento.
Aqueles que são principiantes neste admirável mundo novo das escolhas verdes poderão ter que se confrontar com emoções contraditórias, sentindo que nunca poderão fazer o suficiente e carregando um fardo pesado na consciência quando dão a primeira dentada na maça verde. É possível aliviar este fardo através da oferta de recompensas progressivas e contínuas de acordo com os objectivos cumpridos por parte do consumidor. Incentivar o progresso e não a perfeição. E dado que esta é uma viagem imperfeita que todos estamos a trilhar, por que não torná-la mais agradável com algumas recompensas ao longo do caminho?

O RecycleBank, por exemplo, recompensa os consumidores de acordo com a reciclagem que estes fazem, através da colecção de “pontos” que podem ser descontados num conjunto variado de produtos. E quando concebeu o programa, assegurou-se que não confundiria o comportamento desejado (a utilização eficiente da energia) com a recompensa. Ou seja, o RecycleBank não recompensa o comportamento ecológico dos seus consumidores apenas com produtos ecológicos, mas sim com uma gama variada de produtos “normais” que todos querem e gostam.

6. Punir de forma inteligente

A vergonha, o estigma e a culpa podem ser excelentes motivadores, desde que não sejam  utilizados em demasia.
A pesquisa realizada pela OgilvyEarth demonstrou que a culpa e a vergonha funcionam melhor naqueles que maiores ofensas cometem no espaço verde, ao passo que, para os que já tentam dar o seu melhor, esta estratégia os poderá demover de continuarem com os seus progressos. Como é sabido, ninguém gosta de sentir o peso da culpa e se oferecer aos consumidores formas de neutralizar este sentimento, eles sentir-se-ão agradecidos. Todavia, é sempre necessário imprimir bem a diferença entre o bem e o mal. E isso foi o que aconteceu em Washington DC depois de ter sido lançado um estudo que forçou os consumidores que queriam um saco de plástico a terem de o pedir à frente dos demais clientes. No primeiro trimestre a seguir à publicação do estudo, a utilização de sacos de plástico diminuiu de 68 milhões para 11 milhões. Em suma, a partir do momento em que uma decisão normalmente privada passa a ser do domínio público, evitar a culpa transformou-se num poderoso motivador para alterar os comportamentos.

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7. Não pare de inovar. Aposte em coisas melhores.

A ideia não é dar passos à retaguarda. Escolhas sustentáveis de alta performance são a chave apara a adopção massificada.
Os consumidores não estão dispostos a sacrificar a performance pela sustentabilidade. E fazem muito bem. O detergente Persil pequeno e ultra-concentrado da Unilever poupa 35 milhões de litros de água por ano em Espanha.

Mas não se pode apenas confiar na credibilidade da marca. Graças a uma já longa história do premium pricing inerente ao verde, a fasquia para os produtos sustentáveis está cada vez mais elevada. Já não é suficiente os produtos terem uma boa performance, mas sim elevarem-na à excelência. Empresas como a Nike e a GE encararam o desafio da performance como uma oportunidade de inovação. A utilização de materiais sustentáveis nos sapatos desportivos aumentou o conforto e a performance, e as inovações provenientes do programa “ecomagination” [da GE] transformaram-se num negócio de 18 mil milhões de dólares.

As empresas precisam de ter uma visão total de todo o seu negócio, e não apenas da peça referente à sustentabilidade global.

8. Liberte-se dos estereótipos

O marketing verde tem de se popularizar e não ser visto como uma associação a um movimento hippy qualquer.
Imagine alguém que é defensor de causas ambientais. Normalmente, terá tendência para visualizar uma personagem a comer qualquer coisa granulada e integral e vestido com roupas típicas dos hippies. Lá porque um produto é ecológico não significa que tenha de ser embrulhado em serapilheira. Existe uma verdadeira urgência em nos libertamos dos estereótipos do verde e a melhor forma de o fazer poderá ser não mencionar sequer a palavra começada por “V”.

Julie Gilhart, anterior Fashion Director da famosa loja Berneys NY e uma agente da mudança em termos de sustentabilidade, não percebia por que motivo os primeiros produtos, fabulosos e amigos do ambiente, que colocou à venda na loja não estavam a vender tão bem quanto os demais. Decidiu apostar numa estratégia diferente e retirou, das etiquetas, todas as referências à ecologia. As vendas aumentaram de imediato. Ou seja, percebeu que os clientes fugiam da imagem e da etiqueta “inferior” que o produto “amigo do ambiente” expressava. E, na sua ausência, os benefícios dos materiais ecológicos e do processo produtivo falaram por si mesmos: peças de vestuários mais macias e luxuosas.

9. Transforme o “amigo do eco” em “amigo do ego”… masculino

“O verde é para as meninas” não é uma proposição sustentável para o “homem macho”
O movimento verde é percepcionado, por 82% dos respondentes no presente estudo, como sendo feminino. Portanto, a única hipótese para os marketers é torná-lo “macho”.

Um exemplo é a publicidade feita para os carros amigos do ambiente e que pode ser ilustrado por duas marcas: o Prius e a BMW. Se nos anúncios ao Prius, a escolha recaiu num conjunto de crianças a sorrirem num prado verde, o BMW EfficientDynamics optou por uma abordagem diferente: não é o carro que faz mal ao ambiente, mas a tecnologia que é antiquada. Ou seja, a BMW quis passar a seguinte mensagem: “e se encararmos a sustentabilidade como o gatilho para se inventar a próxima geração de Máquinas Perfeitas para a Condução?”. E a estratégia resultou.

10. Transforme a sustentabilidade em algo tangível

A sustentabilidade é difícil de ser seguida se o caminho não for apontado. Procure formas que ajudem os consumidores a ver o invisível e a fazer contas difíceis
A distância entre o ponto de venda e o Árctico é demasiado longa. E se a pegada de carbono é difícil de calcular até para os cientistas, como é que podemos esperar que o consumidor a determine? É necessário simplificar a contabilidade mental e traduzir os benefícios obscuros da sustentabilidade em algo que seja imediato e concreto.

Um bom exemplo é o Wattson, um dispositivo que mede a quantidade total de energia que está a ser utilizada em casa. Quando a start-up britânica DIY Kyoto, o começou a comercializar, adicionou-lhe cores que mudam de acordo com a quantidade de energia que está a ser gasta. Quando os consumidores conseguirem sentir os efeitos directos dos seus comportamentos nos seus bolsos, a mudança de comportamentos será muito mais fácil.

11. Tornar mais fácil a navegação

A eco-suspeição e a eco-confusão têm de ser abordadas com verdade, transparência e com um excelente “mapa de estradas”.
Comprar verde porque é a norma é uma coisa. Acreditar na verdade subjacente ao verde é outra. A panóplia de selos e certificações ambientais teve como boa intenção ajudar os consumidores mais despertos para este tipo de questões a fazerem melhores escolhas. Todavia, a estratégia acabou por ter um efeito contrário, gerando uma enorme suspeição e confusão. Os campeões da sustentabilidade já percorreram um bom caminho para mudar atitudes, mas os marketers arriscam-se a diluir o valor que os consumidores colocam nos seus produtos verdes através da confiança num monte de símbolos em falência.

Assim, os retalhistas estão a começar a criar um “sistema de navegação para o verde”. Todavia, colocar no produto e por exemplo, um número que explicite a sua pegada de carbono, acaba por não ajudar o consumidor, pois este não tem ideia se X é muito ou pouco. Assim, e de acordo com a UK’s Food Standard Agency, a “contabilidade mental” funciona melhor com cores. Etiquetas vermelhas para produtos com elevados teores de gorduras, o laranja para valores médios e o verde para as quantidades reduzidas. Nas decisões de compra alimentares, esta contabilidade mental passou a ser tão fácil como referenciar estas três cores.

12. Opte pelo hedonismo em vez do altruísmo

Ajude os consumidores a vislumbrarem o divertimento do lado verde da vida.
Estimular uma alteração de comportamentos não tem de ser assim tão complicado. Os humanos respondem fortemente a dois motivadores: ao prazer e ao divertimento.

Tornar o consumo eficiente de energia “divertido” não é tarefa fácil. Mas a Energy Smackdown, uma inovação da BrainShift Foundation, encontrou um meio de gerar momentos recreativos nesta actividade: estabeleceu um concurso entre comunidades para premiar a que conseguir gastar menos energia num período de 12 meses. E duas casas de cada comunidade são filmadas para uma série de televisão do Energy Smackdown.

Seja por si próprio, pelo ambiente, ou por qualquer outra coisa, a única coisa que verdadeiramente interessa é saber que a mudança é para melhor. Não interessa por que motivo vai mudar ou como vai mudar. Mude apenas. O resultado é que conta e não a forma como chega lá.

Editora Executiva