Vários temas que têm vindo a marcar o ano de 2018 foram transpostos para as páginas de livros acabadinhos de publicar. As sugestões do conselheiro de liderança da Google para ajudar a revolucionar o clima de insatisfação e apatia que asfixia os trabalhadores das empresas; os argumentos de um insider da indústria tecnologia que nos insta a sair das garras das redes sociais; a visão tenebrosa, mas com um toque de optimismo, de quem acredita estarmos a viver numa nova idade das trevas; as vantagens da denominada “agile management”, crescentemente experimentada por empresas de todas as dimensões e, finalmente, as deliciosas histórias, espalhadas por 200 entrevistas, de quem contribuiu, para o bem e para o mal, para inscrever na História o mais do que famoso Silicon Valley. A falta de tempo para ler não é desculpa
POR HELENA OLIVEIRA

The Meaning Revolution: The Power of Transcendent Leadership
Fred Kofman

Tem sido, e continua a ser, um dos temas mais debatidos no mundo do trabalho da actualidade: a ausência de envolvimento e compromisso por parte dos trabalhadores face às funções que desempenham e o que isso acarreta não só em custos pessoais, mas também empresariais. Completamente desligados, sem qualquer sentimento de pertença ou de significado pessoal, a percentagem de trabalhadores que “trabalha por trabalhar” tem vindo a aumentar substancialmente de ano para ano. E Fred Kofman, actualmente conselheiro de liderança na Google e antigo vice-presidente da mesma área no LinkedIn, pretende mudar esta realidade. Em The Meaning Revolution, Kofman explica – de uma forma diferente face aos muitos que já fizeram essa tentativa – por que motivo a motivação consiste no mais potente impulsionador para que possamos ter a hipótese de servir um propósito mais alargado, que vá além das nossas carreiras e de nós mesmos, sendo muito mais importante do que o salário, os benefícios, os bónus ou outro tipo de incentivos materiais. E, assegura, as empresas que se concentram, com sucesso e legitimamente, nas suas pessoas, nas suas equipas e que lutam para construir uma cultura que privilegie este propósito são as que superam, em larga escala, as suas concorrentes.

A abordagem de Kofman tem muito pouco a ver com as práticas correntes ensinadas nas escolas de negócios e nos tradicionais livros de gestão. Ao juntar a economia à teoria de negócios, à comunicação e à resolução de conflitos, sem esquecer o aconselhamento familiar e a meditação, o autor argumenta no seu livro que a nossa mais profunda, não confessada e universal ansiedade tem origem no medo de a nossa vida estar a ser desperdiçada – e de que o seu fim chegue antes de termos conseguido “entoar a nossa canção”. De acordo com a sua pesquisa – e em conjunto com outras tantas – Kofman garante que os incentivos materiais – o salário e os benefícios – representam apenas 15% da motivação dos empregados no local de trabalho. Os restantes 85% são estimulados por uma necessidade de pertença, pelo sentimento de que aquilo que fazemos no dia-a-dia faz alguma diferença e de que a forma como despendemos o tempo que passamos na Terra serve um propósito que vai muito mais além de nós mesmos.

No livro, Kofman introduz também o conceito de “líderes transcendentais”, e que se podem posicionar em qualquer que seja o lugar na hierarquia, e que são aqueles disponíveis para pôr de lado os seus próprios interesses e ajudar os outros a sentirem-se ligados entre si, seja numa equipa, numa organização, ou numa missão específica, fazendo parte do mesmo propósito nobre. O actual estratega de liderança na Google assegura ainda que qualquer organização envolvida num trabalho “não violento” e “não aditivo” possui aquilo que denomina como um “projecto de imortalidade” e que o desafio para os líderes é o de identificar e expandir esse projecto central, para inspirar todos os stakeholders a fazerem parte do mesmo.

Ten Arguments for Deleting Your Social Media Accounts Right Now
Jaron Lanier

Jaron Lanier é uma das figuras mais controversas de Silicon Valley. Um dos pais fundadores da realidade virtual –  o responsável pela cunhagem do termo – e considerado como um “génio da high tech”, foi dos primeiros a alertar para os perigos das redes sociais, assegurando que as mesmas nos fazem mais tristes, mais zangados, menos empáticos, mais temerosos, mais isolados e mais tribais. Igualmente sobre um dos temas que mais fizeram correr tinta este ano, em Ten Arguments For Deleting Your Social Media Accounts Right Now, Jaron Lanier faz bom uso dos seus amplos conhecimentos enquanto um  insiderdo sector para explicar de que forma as redes sociais realmente funcionam – nomeadamente enquanto “vigilantes constantes” e manipuladoras do subconsciente dos seus utilizadores –  e também por que motivo os seus efeitos perigosos e cruéis estão no centro do actual modelo de negócios e design de muitas empresas. Para além da oferta de dez argumentos simples para nos libertarmos do seu efeito aditivo, o seu manifesto traça ainda uma alternativa que proporciona todos os benefícios das redes sociais – sim, porque obviamente que também os há – mas sem os pontos negativos que as caracterizam.

As razões de Lanier para a necessidade de nos libertarmos do poder tóxico com o qual as redes sociais nos asfixiam inclui a tendência de mostrar o que de pior há em nós, de transformar a política em algo terrível, de nos enganar com noções de popularidade e sucesso completamente ilusórias, de deturpar a nossa relação com a verdade, de nos desligar dos outros mesmo quando estamos mais “ligados”do que nunca, de nos roubar tempo e de anular o nosso livre arbítrio com publicidade direccionada.

E questiona ainda: como é que podemos permanecer autónomos num mundo em que estamos continuamente a ser vigiados e constantemente pressionados por algoritmos liderados por algumas das empresas mais ricas da História e cuja forma de fazer dinheiro é manipulando o nosso comportamento? De que forma é que os seus benefícios podem ser superiores às perdas catastróficas de que sofre a nossa dignidade pessoal?

Apesar de crítico e muito céptico em relação às redes sociais, Lanier continua a ser um optimista da tecnologia que, ao mesmo tempo que demonstra o mal que as lidera, consegue também visionar um palco humanista para as mesmas que nos pode direccionar para uma vida mais rica em sentido e para formas muito mais benéficas de nos relacionarmos com o mundo.

New Dark Age: Technology and the End of the Future
James Bridle

“A nossa visão é crescentemente universal, mas a nossa capacidade de actuação é cada vez mais reduzida”, afirma o escritor, artista visual e jornalista James Bridle no seu mais recente livro que, tal como o nome indica, se assume como um guia profético muito negro para o futuro que se avizinha. Em termos muito simples, o seu argumento é o de que sabemos cada vez mais e mais sobre o mundo que nos rodeia, ao mesmo tempo que somos cada vez menos e menos capazes de fazer algo sobre o mesmo. Este sentimento de impotência, e em vez de nos empurrar para uma reconsideração do que damos como adquirido, está, de acordo com o autor, a conduzir-nos para uma paranóia e desintegração sociais cada vez mais profunda. Como uma espécie de Orwel da era dos computadores, Bridle está convencido, por exemplo, de que existe uma ligação entre as alterações climáticas e o excesso de informação.

Na realidade e como escreve, estamos perdidos num imenso mar de informação, crescentemente divididos pelo fundamentalismo, por narrativas simplistas, por teorias da conspiração e pela política pós-factual. E, em simultâneo, aqueles que estão no poder utilizam a nossa falta de compreensão para escavarem mais fundo no poço dos seus próprios interesses. Ou e em suma, apesar da acessibilidade – aparente, como assegura – à informação, estamos a viver uma nova Idade das Trevas.

Desde sistemas financeiros desonestos a algoritmos que nos incitam a comprar aquilo que não precisamos, da inteligência artificial ao secretismo do Estado, perdemos a noção de que forma o mundo é governado. Os mediaestão repletos de especulações não verificáveis, muitas delas geradas por software anónimo, enquanto as empresas dominam os seus empregados através de sistemas de vigilância ou da ameaça da automação. Como são unânimes todos os críticos, a prosa de Bridle pode ser densa, mas os seus “saltos analíticos” são simultaneamente iluminados e aterradores, sugerindo que, nos níveis que estão para além da vigilância e da conspiração, possuímos a tecnologia necessária para estabelecer sistemas de uma complexidade e controlo tão grandes, que se torna muito difícil percebermos quem é que realmente está no comando e o que realmente querem essas pessoas.

Para o autor, todavia, não podemos acreditar que estamos limitados pela escuridão e pela impotência. “Temos apenas que pensar, pensar outra vez e continuar a pensar. A rede – composta por nós e pelas nossas máquinas, e pelas coisas que pensamos e descobrimos em conjunto – assim o exige”.

The Age of Agile: How Smart Companies Are Transforming the Way Work Gets Done
Stephen Denning

A denominada “gestão ágil” não sendo propriamente uma tendência nova – há já umas boas décadas que existe – só ganhou realmente asas na indústria do desenvolvimento de software. Com melhorias substanciais na qualidade, inovação, e rapidez de entrada no mercado, o “movimento Ágil”está a disseminar-se rapidamente num conjunto diversificado de sectores, não representando apenas uma buzzword da gestão, mas uma forma inteiramente nova de encarar também o próprio trabalho. Em termos muito gerais, capacita uma equipa, uma unidade de negócio ou um pequeno empreendimento a adaptar-se de forma “ágil” no que respeita a actualizações ou melhorias dos seus produtos e/ou serviços para ir ao encontro, de forma célere, das tecnologias em permanente mudança e das necessidades dos clientes.

Escrito por Stephen Denning que, até ao ano 2000, ocupou várias posições de grande prestígio no Banco Mundial, o livro em causa analisa casos de gigantes empresariais muito distintos entre si – como por exemplo o Barclays Bank ou a Microsoft – que optaram por esta gestão “agilizada”, tendo como base o mundo das startups e, é claro, Silicon Valley. Geralmente, o exemplo mais comum escolhido para traduzir a “agile management” é o Spotify.

Com base em três leis por excelência – equipas de pequena dimensão, enfoque no cliente e efeito de rede -, a “agile management” deita igualmente por terra “ a velha forma de fazer as coisas”. Por exemplo, o valor do accionista como objectivo principal da empresa é desviado para o enfoque no cliente e o ensino da estratégia nas escolas de negócios deverá esquecer as Cinco Forças de Porter e privilegiar, acima de tudo, a ideia de que “o cliente é rei”, defendida pelo pai da gestão, Peter Drucker.

Numa organização “ágil”, equipas que se auto-organizam estão, de forma contínua, a oferecer novo valor para os clientes. E porque o trabalho é feito de forma iterativa e com uma interacção contínua com os utilizadores, a organização pode, de forma contínua, actualizar o que faz para cada utilizador individual, muitas vezes quase em tempo real. Quando o “Agile” é feito de forma adequada, as equipas encontram-se a trabalhar no interior de um modelo de negócio no qual a organização gera valor não só para si mesma, mas também para o cliente. Se antes de comprar o livro pretender perceber melhor o que significa esta forma de gerir e trabalhar, aconselhamos a leitura deste artigo da autoria do próprio Stephen Denning.

Valley of Genius: The Uncensored History of Silicon Valley (As Told by the Hackers, Founders, and Freaks Who Made It Boom)
Adam Fisher

O título já diz muito e é suficientemente apelativo para termos vontade de adquirir rapidamente o livro. Mas, e mais do que a história de Silicon Valley contada por um jornalista – da revista Wired – que “nasceu” no vale, o que mais lhe confere um gostinho especial é o facto de se basear em 200 entrevistas exactamente feitas a muitos dos seus hackers, fundadores, freaksnerds, hippies, engenheiros, cientistas, multimilionários da tecnologia e outro tipo de pessoas nada convencionais que inventaram o futuro da América, e do resto do mundo – desde os primeiros computadores pessoais, aos videojogos, à Google ou ao Facebook – e ao longo das já várias gerações que habitam a tão famosa Bay Area de São Francisco.

Contadas na primeira pessoa, as histórias deste “Vale de Génios” apresentam factos, dão a conhecer a personalidade dos seus narradores, em conjunto com uma série de “mitos” ou mexericos, com a descrição de festas loucas e conferências que em nada obedecem às regras formais dos eventos”normais”, e que contam, em muito, para aumentar o sumo da narrativa. O livro oferece o testemunho também de muitos empreendedores e das suas startups, de como nasceu e se desenvolveu uma cultura singular e sem paralelo, tendo como pano de fundo os bastidores onde tudo aconteceu. Através das entrevistas, o leitor sentir-se-á transportado para o excêntrico ambiente que caracterizou, desde o início, Silicon Velley, tendo a oportunidade de “ouvir” os seus muitos e distintos personagens. Desde o criador do Napster, Sean Parker – que mais tarde viria a ajudar a lançar o Facebook -, ao realizador Ridley Scott, que dirigiu o primeiro e excepcional anúncio do também pioneiro computador Macintosh, ao programador Jaron Lainer (autor de um dos livros acima sugerido) e inventor do termo “realidade virtual”, ao co-fundador do Twitter Noah Glass e até do icónico e já desaparecido Steve Jobs (com recurso a entrevistas antigas). De uma riqueza apaixonante, é, sem dúvida, um dos livros que ficará na história da literatura do ano de 2018.

Editora Executiva