A transição para uma Economia (mais) Circular implica necessariamente a adaptação e a criação de novas indústrias e modelos de negócios, focados mais na prestação de serviços e na retenção de valor de materiais e produtos, do que na sua venda e deposição. Este e outros temas serão discutidos a 24 deste mês, em Montalegre, na 1ª Conferência Internacional em Economia Circular
POR CARLOS OLIVEIRA AUGUSTO

“(…) Custa-nos a reconhecer que o funcionamento dos ecossistemas naturais é exemplar. Ao contrário, o sistema industrial, no final do ciclo de produção e consumo, não desenvolveu a capacidade de absorver e reutilizar resíduos e escórias. Ainda não se conseguiu adoptar um modelo circular de produção que assegure recursos para todos e para as gerações futuras, e que exige limitar, o mais possível, o uso de recursos não renováveis, moderando o seu consumo, maximizando a eficiência no seu aproveitamento, reutilizando e reciclando-os. A resolução desta questão seria uma maneira de contrastar a cultura do descarte que acaba por danificar todo o Planeta, mas nota-se que os progressos neste sentido são ainda muito escassos”.
Papa Francisco, Laudato si’, 2015

O mantra da Sustentabilidade, tal como definido no Relatório Brundtland, ou seja, o conceito generalista de “garantir a satisfação das necessidades presentes sem pôr em causa as das gerações futuras”, foi, ao longo do tempo, perdendo o seu fulgor inicial, muito por causa da sua repetição maquinal, aplicado a quase tudo e todos, sempre que o assunto em discussão é a Sustentabilidade ou o Desenvolvimento Sustentável.

Mais recentemente tem vindo a ganhar relevância e notoriedade o termo “Economia Circular”, em oposição ao que se designa por “Economia Linear” ou de desperdício.

De facto, esta consiste basicamente num sistema ineficiente de extracção de matérias-primas, a sua posterior transformação em produtos e consequente descarte, mesmo antes do seu colapso ou fim da sua vida útil.

Em oposição, a Economia Circular diz essencialmente respeito em manter os materiais e produtos em utilização, assumindo que são um recurso que tem de ser preservado e valorizado, em vez de serem tratados como “lixo” uma vez que tenham sido “consumidos”; um conceito circular designado por “close the loop”.

Desse modo, para além de uma concepção ambientalmente orientada – Ecodesign – com o intuito de estender a vida útil dos produtos, e permitir posteriormente a sua reutilização, remanufactura ou reciclagem, a transição para uma Economia (mais) Circular implica necessariamente a adaptação e a criação de novas indústrias e modelos de negócios, focados mais na prestação de serviços e na retenção de valor de materiais e produtos, do que na sua venda e deposição.

Disto mesmo está consciente a Comissão Europeia, que se manifestou através de duas Comunicações – Towards a Circular Economy: A zero waste programme for Europe e Closing the loop – An EU action plan for the Circular Economy – onde se defende um programa de acção no curto e médio prazo com vista à transição para a Economia Circular, tendo como objectivos últimos a preservação do ambiente, o crescimento sustentável da economia e a criação de empregos locais e regionais.

Do mesmo modo, a Ellen MacArthur Foundation (instituição de referência no assunto) define Economia Circular como sendo aquela que “…é regenerativa e restaurativa, por princípio. O seu objectivo é o de manter produtos, componentes e materiais no seu mais alto nível de utilidade e valor, todo o tempo.”

Concomitantemente, a gestão inteligente e eficiente dos fluxos de energia e de materiais é um dos pilares de uma sociedade mais sustentável, e tida como indispensável no paradigma da Economia Circular, nomeadamente ao nível local e regional.

Em comparação com o modelo convencional, que depende estruturalmente da importação de energia e de materiais, a Economia Circular enfatiza a importância nas estratégias eficientes de energia renovável e de materiais endógenos, sendo caracterizada, ao nível regional, por simbioses industriais, estratégias de desenvolvimento e políticas públicas de valor acrescentado.

A Gestão de Fluxo de Materiais (GFM) é, assim, uma ferramenta adequada e indispensável para a concepção e implementação de estratégias inovadoras de Economia Circular e de Sustentabilidade, à qual terá que ser dar a devida atenção através da sua inserção nos “curricula” das escolas de Gestão e Engenharia.

Atentas a esta realidade, um conjunto de Instituições do Ensino Superior, Autarquias, Organismos e Empresas de Portugal, Espanha, Alemanha e Holanda promoveram, e vão realizar a 24 deste mês, em Montalegre, a 1ª Conferência Internacional em Economia Circular- CIEC 2016.

Este evento, aberto a todos, e que decorre em simultâneo com o Encontro Internacional com o Património – ENICOP, constitui uma oportunidade única para se discutir o tema e para se lançarem as bases com vista a projectos inovadores na área da educação e da implementação da Economia Circular, em Portugal.

Tal como dizia Buckminster Fuller “…para mudar um paradigma existente não devemos lutar para tentar mudar o modelo problemático. Cria-se um novo modelo e tornamos o antigo obsoleto”.

Engenheiro e CEO da FACTOR4Sustainability®