Em diferentes geografias e sectores de actividade esta é a pergunta que hoje se faz mais recorrentemente: após décadas em que as marcas estiveram no epicentro, como se deverão as empresas (re)organizar tendo por base um modelo mais consumer-centric?
POR
EURICO NOBRE

A resposta não é linear, como nada é linear por estes dias. E nada disto é novo. Como escreveu Joe Tripodi, Chief Marketing Officer (CMO) da Coca-Cola, no artigo “From Impressions to Expressions” publicado pela Harvard Business Review em 2011. “São muitos os que se lembram da altura em que o papel do CMO era muito mais simples. A informação fluía apenas numa direcção: das empresas para os consumidores. Quando concebíamos os nossos planos e budgets a métrica principal era as impressões: ou seja, quantas pessoas iriam ver, ouvir ou ler o nosso anúncio.”

A realidade é agora outra e muito diferente. Hoje, a informação flui entre diferentes meios e aparelhos, com a lógica própria de cada pessoa que os utiliza, em diferentes momentos e como resposta a diferentes necessidades. Meios e aparelhos que se por um lado se complementam, até pela facilidade com que os conteúdos fluem, por outro concorrem entre si, pelo bem mais precioso e escasso: a atenção de cada um de nós.

Hoje, conclui Tripodi, o único sítio onde os consumidores continuam passivamente sentados a absorver as mensagens que as marcas desenvolveram especialmente para si chama-se Mad Men. Um admirável mundo novo que, ainda que seja fácil de perceber, é sobremaneira difícil de colocar em prática, na exacta medida em que afecta a lógica como as empresas estão organizadas, assim como as suas estruturas formais e informais.

Com isto não se pretende afirmar que o que antes era preto é agora branco e que, num ápice, tudo mudou. Importa contudo perceber que não fazer nada, não é opção.

[pull_quote_center]“Hoje a informação flui com a lógica própria de cada pessoa que a utiliza”[/pull_quote_center]

Quando a Internet surgiu de forma massificada na década de 90, por muito revolucionária que tenha sido, nomeadamente pela democratização do acesso à informação, na prática apenas acrescentou mais um canal, que em nada desafiou a lógica dominante.

O Social, por oposição, sugere uma revolução maior: é uma mudança de cultura. A partir do momento em que cada pessoa passou a ter a possibilidade de, mesmo sem qualquer tipo de conhecimento tecnológico, além de receptor passar também a ser emissor e difusor de conteúdos, o paradigma de relacionamento mudou. Não apenas no modo como as pessoas passaram a consumir informação, a tomar decisões ou a comprar, mas também nas possibilidades oferecidas às organizações para interagirem com os seus consumidores como indivíduos, com os seus colaboradores através da partilha e reforço de valores, ou com os seus parceiros, explorando novas formas de colaboração e de acrescentar valor.

No essencial, o que se define como Social Business tem um único foco: as pessoas. Por oposição com o e-Business, que ganhou forma de imperativo há vinte anos, com os ganhos a anunciarem-se por via da tecnologia, de maior eficiência ou de produtividade.

Qual é então o valor que oferece o mundo cada vez mais digital em que vivemos? São quatro as dimensões principais:

  1. Valor para a marca na criação de reputação e de valores. Através da demonstração de abertura para colaborar e na capacidade para responder e envolver em tempo útil, o que significa uma abordagem omnipresente e ‘omni-canal’. Através de conteúdo que é mais relevante, o que significa a disponibilização da mensagem certa no momento apropriado – como o faz a Burberry, por exemplo, ao disponibilizar nas suas lojas vídeos que explicam o processo de fabrico de cada mala, ou a Audi, no seu concessionário do futuro, uma experiência diferente, diferenciadora e altamente personalizável de test drive. Através da motivação de recomendações por parte de terceiros, entendendo que o valor total de um cliente não tem apenas que ver com o indivíduo, ao avaliar a transacção e o life time value, mas também com o que acrescenta com o seu network e a sua capacidade de influência e de colaboração.
  2. Valor para os clientes. Ao premiar aqueles que são mais fiéis à marca, enfatizando e reconhecendo a sua importância, com a consciência de que nem todos os clientes são iguais e que, como tal, merecem um tratamento diferenciado. Fazendo com que os clientes comprem mais, sabendo que o seu envolvimento depende mais e mais da história que se conta ou da utilidade que se lhe é acrescentada.
  3. Aumentar a excelência operacional. Reduzindo o time to market, nomeadamente através da activação dos early adopters. Reduzindo os custos de desenvolvimento e envolvendo os consumidores mais cedo no processo de inovação. Testando as ideias cedo, recorrendo a consumidores com vontade crescente de participar e serem ouvidos na avaliação de conceitos de produto ou de comunicação. 
  4. Fortalecer a cultura e a relação com colaboradores. Capacitando os colaboradores no seu papel de embaixadores da marca ou da empresa. Treinando e activando a equipa. Melhorando a performance, nomeadamente através da partilha daqueles que são os objectivos corporativos e, de forma colaborativa e individual, explorando formas de os atingir.

Voltando a Joe Tripodi, este é o desafio: “Temos de criar narrativas com as quais as pessoas se possam envolver. Temos de criar experiências que, no limite, apenas irão envolver poucos mas que, através destes, serão relevantes o suficiente para gerar conversas com muitos mais.

Como o conseguir? Diria que antes de mais importa deixar cair uma certa altivez ainda dominante e assumir uma postura mais humilde. Como a Coca-Cola, historicamente a marca mais valiosa do mundo, para que a própria marca seja tão mais valiosa quanto mais estiver na posse dos seus consumidores. Adicionalmente, entendendo a customer journey – quais são os eventos que motivam que acções; como pesquisam os clientes e potenciais clientes; como compram; como usam; como partilham as suas experiências – e percebendo como fazer parte desta, e não como impor caminhos.

De um ponto de vista da organização, poderão sintetizar-se em cinco quick wins as medidas de intervenção.

  1. Convide os seus clientes a participar. Como antes referido, o seu poder de influenciar e de acrescentar valor é maior que antes. Avaliar somente quanto representam considerando as transacções ao longo do tempo, será, no mínimo, redutor.
  2. A tecnologia é a nova fonte de criatividade. A força de uma ideia é muito mais que um formato de comunicação, de uma história que se conta. É também a utilidade que se acrescenta (como a plataforma Nike+, que num ápice se tornou numa referência para a comunidade crescente de pessoas que correm), e que na maioria das situações é potenciada por soluções e inovações de base tecnológica.
  3. Não é possível, nem desejável em muitos casos, promover mudanças demasiados radicais. Mesmo sabendo-se que a fonte de receitas e de vantagem competitiva no futuro poderá ser diferente da actual, ainda é no negócio actual que está assente a operação. Contudo, é comum observar que nas organizações existe um enorme défice de talento. Catalizadores de mudança capazes de, harmoniosamente, equilibrar os lados direito e esquerdo do cérebro, o emocional e o racional, a ciência e a magia, os dados e as narrativas.
  4. Story Telling. Por definição, content marketing, uma das buzzwords do momento, é marketing tão bem feito – porque desperta emoções ou entretém – que apetece envolver e fazer parte.
  5. Os seus consumidores escolhem o canal. Mais uma vez, importará entender como se informam, decidem e o que adquirem, em vez de valorizar como o fazem, escolhendo a via do lugar comum. Não é expectável que fazer mais do mesmo, ou muito mais do mesmo, possa atingir resultados diferentes.

Afinal, num mundo mais e mais complexo, poderá levantar-se a questão, fundamental e pertinente, de como medir o sucesso. Não existindo métricas perfeitas, na passagem das impresses para as expressões, haverá uma que se impõe às demais: qual o resultado no bottom line. Caberá a si a missão de decidir avaliá-lo num prazo mais curto ou mais alargado.

CEO da Ogilvy & Mather Portugal, 3º Executive MBA AESE/IESE e Professor da AESE