No trabalho, há factores que não podemos controlar, outros sim. Ser mais ou menos feliz no trabalho, no que depende de si próprio, exige encontrar um verdadeiro sentido no mesmo, o mais profundo possível
POR DOMÈNEC MELÉ

Domènec Melé é Catedrático de Ética Empresarial na IESE Business School, Universidad de Navarra, Espanha
Domènec Melé é Catedrático de Ética Empresarial na IESE Business School, Universidad de Navarra, Espanha

Para Aristóteles, a vida conseguida é permutável com “felicidade”. Todavia, na cultura actual confunde-se, muitas vezes, a felicidade com a satisfação de desejos, sejam eles dinheiro, poder, prazeres, sucesso, posição social, reconhecimento, ter boa saúde, beleza, força física, uma personalidade admirada pelos outros, ou seja o que for. Obter estes desejos produz uma certa satisfação, mas a experiência mostra que a um desejo se segue outro e nada acaba por conseguir preencher todos estes anseios.

Por outro lado, relacionar “fazer aquilo que me der na real gana” (desejo) com a felicidade é uma atitude algo superficial. Uma pessoa madura interroga-se sobre como as actividades que efectuamos ao longo da vida, podem contribuir para uma existência plena e feliz.

O trabalho é uma destas actividades e muito importante, certamente, tanto em termos de dedicação temporal, como de intensidade. Poderá o trabalho ser também um meio para uma vida conseguida e feliz? Karl Marx, perante as condições de trabalho do século XIX, dizia que as pessoas fugiam do trabalho como da peste. No mesmo século XIX, o economista John Stuart Mill via os trabalhadores com amor pelo dinheiro e aversão pelo trabalho. A própria Bíblia, depois do pecado original, fala de penosidade associada ao trabalho. Ter-se-á de excluir o trabalho das actividades humanas para obter uma vida conseguida e feliz? Diria que não.

Marx e Mill estavam condicionados pelas deploráveis condições de trabalho da sua época. Hoje, as condições de trabalho são muito diferentes das de então, embora, de um ou outro modo, o trabalho seja igualmente penoso, enquanto fonte de angústias, fadigas e aborrecimentos, o que não impede, contudo, que uma pessoa possa desenvolver-se no trabalho, não apenas no plano profissional, como também enquanto pessoa; e, de algum modo, obter alegria com o trabalho. A Bíblia nos seus dois primeiros capítulos apresenta o trabalho como algo nobre, incluído nos planos de Deus para o homem, que não é revogado pelo pecado original.

Num amplo inquérito realizado nos Estados Unidos a pessoas das mais variadas profissões, ao ser-lhes perguntado se se sentiam satisfeitas com o seu trabalho, 47 % responderam afirmativamente e 33 % disseram que se sentiam muito satisfeitas. Pode parecer assombroso que 80 % se sintam felizes ou muito felizes no seu trabalho. Será devido àquilo que ganham? Seguramente, não. Algumas podem ganhar muito, mas custa a acreditar que 80 % se sintam felizes devido ao que ganham, pelo menos se ganham o suficiente para viver. O motivo é a realização pessoal de se sentir útil, dar aquilo que a pessoa tem por uma actividade que contribui para o bem-estar da sociedade; e também saber que, com o trabalho, contribuem para o progresso das suas famílias.

No trabalho, há factores que não podemos controlar, outros sim. Ser mais ou menos feliz no trabalho, no que depende de si próprio, exige encontrar um verdadeiro sentido no trabalho, o mais profundo possível. Ajuda ter uma tarefa adequada às próprias capacidades, mas também depende da atitude adoptada. Um pedreiro medieval afirmava que o seu trabalho consistia em construir uma catedral, enquanto outro se lamentava de ter de estar a picar pedra todo o dia.

Uma adequada relação com as pessoas é outro motivo de felicidade. Também aqui pode depender de quem tivermos à nossa volta, mas, novamente, há muito de atitude pessoal. Respeito e consideração pelas pessoas e uma atitude de colaboração e serviço contribui para tornar a vida mais agradável aos outros, ao mesmo tempo que a pessoa se sente melhor. Nesta linha, e especialmente quando existem responsabilidades directivas, destacaria uma atitude de “cuidado” para com os outros, estar atento a eles, considerando os seus legítimos interesses e necessidades e, sobretudo, procurando o seu desenvolvimento.

Em resumo, descobrir o trabalho como uma tarefa muito nobre na qual a pessoa coloca os seus talentos ao serviço dos outros, é a chave para sermos mais felizes no trabalho.

Catedrático de Ética Empresarial na IESE Business School, Universidad de Navarra, Espanha