Em fase de retoma, os países da UE estão a investir mais em educação, mas têm de garantir a adequação do investimento financeiro. Têm também de tornar os seus sistemas de ensino mais inclusivos, em especial no que respeita à integração de refugiados e migrantes, como conclui o relatório anual da Comissão Europeia sobre Educação e Formação. Entre os 28 Estados-membros, Portugal destaca-se pelos esforços de inclusão no seu sistema educativo, ao mesmo tempo que a emigração galopante de jovens qualificados provoca uma ‘fuga de cérebros’ que poderá ter reflexos negativos na competitividade
POR GABRIELA COSTA

A Comissão Europeia divulgou recentemente a quinta edição do Monitor da Educação e da Formação, que avalia os progressos da Europa na consecução dos objectivos para a educação da estratégia Europe 2020, integrados na ampla estratégia da União Europeia para o crescimento e o emprego.

17112016_AdequarORetratando a evolução dos sistemas de educação e formação europeus através da análise de um amplo conjunto de dados reunidos através de fontes quantitativas e qualitativas como o Eurostat, a OCDE, a rede Eurydice e redes universitárias, este relatório anual regista os progressos da UE e dos respectivos países em relação aos objectivos da estratégia Europa 2020 em matéria de abandono escolar (reduzir a taxa abaixo do 10%), e conclusão do ensino superior (garantir a sua conclusão por, pelo menos, 40% dos jovens dos 30 aos 34 anos).

Mas a Comissão Europeia traça também no documento o desenvolvimento dos valores de referência para 2020 no que respeita à participação na educação pré-escolar e cuidados para a infância, à educação de adultos, ao insucesso escolar em competências de base e à empregabilidade de jovens recém-licenciados, para além de registar os progressos a nível de prioridades transversais, como o financiamento da educação e o desenvolvimento profissional dos professores.

Em termos de resultados globais, a edição deste ano do Monitor da Educação e da Formação revela melhorias rumo a objectivos importantes da UE, como a diminuição das taxas de desemprego. Em 2015, e pelo segundo ano consecutivo, a recuperação do emprego entre o grupo de jovens licenciados aumentou, embora este flagelo se mantenha preocupante num continente ainda em retoma lenta da crise económica e financeira.

Pela negativa, o relatório sublinha a necessidade de os Estados-Membros tornarem os seus sistemas de ensino mais adequados e inclusivos, em especial no que respeita à integração de refugiados e migrantes.

[quote_center]O Monitor da Educação e da Formação integra relatórios nacionais de 28 Estados-Membros sobre as políticas educativas na UE[/quote_center]

A edição de 2016, publicada a 7 de Novembro, conclui que os Estados-Membros “têm de fazer face à dupla tarefa de garantir a adequação do investimento financeiro e de oferecer uma educação de alta qualidade aos jovens de todas as origens, incluindo os refugiados e os migrantes”.

Sublinhando a confiança da Europa nas escolas, universidades e instituições de ensino e formação profissional enquanto “base do crescimento, do emprego, da inovação e da coesão social”, o comissário europeu da Educação, Cultura, Juventude e Desporto, comentou os resultados do relatório da CE, defendendo que “os sistemas de ensino da Europa podem dar um contributo fundamental para enfrentarmos problemas importantes, como sejam o persistente desemprego dos jovens e o lento crescimento económico, além de nos ajudarem a lidar com os novos desafios trazidos pela crise dos refugiados”.

Mas, para Tibor Navracsics, “a educação só poderá cumprir a sua missão se tiver um bom desempenho”, pelo que “hoje, mais do que nunca, temos de garantir que permite que os jovens se tornem cidadãos activos e independentes e que encontrem um trabalho gratificante. Não se trata apenas de assegurar o crescimento sustentável e a inovação. É, isso sim, uma questão de justiça”.

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Países da UE têm de redobrar esforços para a integração

Relativamente ao investimento na educação, os dados mais recentes (2014) do Monitor mostram que a despesa pública com a educação na UE começou de novo a crescer, após três anos consecutivos de contracção. O investimento público na educação cresceu em média 1,1 % ao ano, a nível da UE, e concretamente em cerca de dois terços dos 28 Estados-Membros. Em seis países (Bulgária, Eslováquia, Hungria, Letónia, Malta e Roménia) esse aumento foi superior a 5%. No entanto, dez Estados-Membros reduziram a despesa com a educação em 2014, comparativamente a 2013: Áustria, Bélgica, Chipre, Croácia, Eslovénia, Estónia, Finlândia, Grécia, Itália e Lituânia.

Outra das principais conclusões do relatório anual da Comissão dita que é necessário “envidar mais esforços para tornar os sistemas de ensino mais inclusivos”, particularmente entre os jovens com antecedentes migratórios, cuja integração apresenta benefícios incontestáveis para a CE. É que os seus resultados escolares permanecem inferiores aos dos nacionais residentes e, em 2015, este grupo de jovens registou taxas de abandono escolar precoce mais elevadas (19 %) que a média dos nacionais residentes nos vários Estados-membros (10,1 %), e taxas inferiores de conclusão do ensino superior (36,4 %, contra a média de 39,4 %).

[quote_center]A edição deste ano do relatório anual da CE sobre educação revela melhorias em áreas chave para a União, como o desemprego e a crise de refugiados[/quote_center]

Considerando o aumento exponencial do número de refugiados e migrantes que chegam à UE (1,25 milhões em 2015, em comparação com 400 mil em 2013, dos quais cerca de 30% têm menos de 18 anos e, na sua maioria, menos de 34 anos), os Estados-Membros devem redobrar os seus esforços, impulsionando a educação como “uma ferramenta extremamente poderosa para promover a integração [destes jovens] na sociedade”, conclui a CE.

Entre as várias respostas que vários Estados-Membros estão já a tentar dar neste contexto, o relatório destaca várias medidas, que vão desde o apoio orçamental ao ensino de migrantes até acções específicas e inovadoras desenvolvidas para “colmatar a insuficiência de competências”.

A Áustria, por exemplo, criou classes de transição no ensino e formação profissionais (EFP) e no ensino geral. A Alemanha deverá proceder ao recrutamento de mais de 40 mil professores e milhares de assistentes sociais para apoiar a criação de cerca de 300 mil novas vagas no sistema de ensino, desde a creche à EFP. A Suécia alterou as regras sobre o acolhimento e a escolarização de novos alunos, criando um sistema precoce de avaliação de competências (nos dois meses seguintes à chegada à escola). A Finlândia tem estimulado o apoio financeiro aos municípios para organizarem classes preparatórias. A França tem várias iniciativas, incluindo a implementação de um programa para facilitar a integração na escola também dos pais. A Bélgica aumentou a capacidade das classes de acolhimento e o número de professores de línguas.

Portugal está, desde Janeiro de 2016, a lançar novas medidas para reforçar o apoio aos alunos migrantes, através do MEC: classes introdutórias, intérpretes e campanhas de sensibilização, por exemplo. O nosso País reforçou a educação cívica nos currículos desde o ensino pré-escolar até ao ensino secundário propondo, entre outras, orientações sobre «educação para o desenvolvimento» e «educação para os media», criou o rótulo «Escola Intercultural» e na próxima etapa, deverá criar uma rede de escolas interculturais. Um grupo de trabalho está a preparar uma estratégia global de promoção da cidadania no ensino que deverá congregar as várias iniciativas lançadas até à data.

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Portugal combate insucesso escolar

Permitindo uma comparação a nível europeu, a partir de relatórios nacionais aprofundados sobre o sistema de ensino em 28 países da UE, o Monitor da Educação e da Formação não se limita a fornecer informações úteis e actualizadas sobre os principais desafios que se colocam aos sistemas de ensino europeus. Também promove a análise e o debate sobre quais as prioridades para a educação e a formação e para a reforma da educação nacional. E apresenta um conjunto de medidas políticas que podem ajudar os Estados-Membros a dar resposta às necessidades da sociedade e do mercado de trabalho (em destaque neste estudo) através da educação.

[quote_center]O investimento público na educação cresceu em média 1,1 % ao ano, a nível da UE[/quote_center]

Essas medidas podem ser apoiadas por um conjunto de instrumentos que ajudam a estimular o investimento em áreas prioritárias no domínio da educação, como o Plano de Investimento para a Europa, o programaErasmus+, a Iniciativa para o Emprego dos Jovens dos Fundos Europeus Estruturais e de Investimento, e o programa Horizonte 2020. A comissão Europeia apoia os esforços desenvolvidos pelos Estados-Membros para reformar os respectivos sistemas de ensino através não só do financiamento facultado por este tipo de programas, como através de cooperação política e de ferramentas de avaliação comparativa.

No caso do Monitor, os relatórios nacionais compilam dados quantitativos e qualitativos que permitem apresentar e avaliar as principais medidas políticas recentemente tomadas ou em curso em cada Estado-Membro da UE. Incidindo na evolução registada desde meados de 2015, complementam as fontes de informação disponíveis sobre os sistemas educativos e de formação nacionais.

Fonte: Cálculos da DG Educação e Cultura, com base nos dados do Eurostat (IFT 2015) e da OCDE (PISA 2012) no Monitor da Educação e da Formação de 2016 - Portugal
Fonte: Cálculos da DG Educação e Cultura, com base nos dados do Eurostat (IFT 2015) e da OCDE (PISA 2012) no Monitor da Educação e da Formação de 2016 – Portugal

Em Portugal, as grandes conclusões dessa evolução, em destaque no relatório nacional, têm pontos positivos e pontos negativos: há uma série de medidas anunciadas pelo Governo para lutar contra o insucesso escolar. Para já, a percentagem de estudantes que abandonam precocemente o sistema de ensino e de formação (18-24 anos) caiu, de 20,5%, em 2012, para 13,7%, em 2015, aproximando-se da actual taxa média da UE – 11%.

A conclusão de estudos superiores na faixa etária 30-34 anos aumentou, de 27,8% para 31,9%, neste período. Em termos de mobilidade, mais estudantes vieram do estrangeiro para frequentar licenciaturas em 2015 (1,9%, em vez dos 1,7% em 2012), e mestrados (6,7% em vez de 5,5%).

[quote_center]Em 2015, e pelo segundo ano consecutivo, a recuperação do emprego entre o grupo de jovens licenciados aumentou[/quote_center]

Já a percentagem de jovens de 15 anos com desempenho insuficiente em Leitura, Matemática e Ciências é, em 2012 (não há dados para 2015) de, respectivamente, 18,8%, 24,9% e 19% (sendo que no mesmo ano a média da UE é 2% a 3% mais baixa).

E há também uma série de medidas para melhorar a equidade no ensino. A educação para a cidadania e a educação intercultural ganhou peso nos currículos. E a integração de migrantes no sistema educativo está a ser reforçada.

No orçamento de 2016 para a educação, que não teve aumentos significativos em relação ao do ano passado (a despesa pública consagrada à educação em percentagem do PIB manteve-se nos 6,2% em 2012 e 2014), o apoio financeiro para as reformas deverá resultar de uma maior eficiência da despesa e de uma diminuição das retenções de alunos.

Os novos Cursos Técnicos Superiores Profissionais (CTESP) estão a contribuir para um aumento das matrículas nos institutos politécnicos e para “abrir novas vias de cooperação com o sector empresarial”. E, a nível de emprego entre recém-diplomados (com 20 a 34 anos mas que abandonam o ensino um a três anos antes do ano de referência), a taxa melhorou de 67,5% para 72,2%. A actual taxa média da UE de emprego neste grupo é 76,9%.

[quote_center]Há menos estudantes portugueses a abandonar precocemente o sistema de ensino (13,7% % em 2015, contra 20,5% em 2012)[/quote_center]

Outra conclusão ainda do relatório nacional incluído no Monitor da Educação e da Formação da CE é que, em conjunto com a alta taxa de emigração de cidadãos portugueses qualificados para outros países europeus, a tendência para a redução de matrículas no ensino superior “está a agravar a crise demográfica do país”. E provoca uma ‘fuga de cérebros’ que poderá “ter reflexos negativos na competitividade” em Portugal.

Algo contraditório com a confiança da Europa, segundo a Comissão Europeia, em “sistemas de ensino eficazes para dotar os jovens das competências de que necessitam” para se desenvolverem como cidadãos e terem a sua carreira profissional.


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Cooperação europeia no domínio da educação e da formação

O quadro estratégico para a educação e a formação para 2020 (ET 2020) enquadra a cooperação no domínio da política de educação e formação de cada país da UE.

Tendo por base quatro objectivos comuns da UE para enfrentar os desafios neste domínio -fazer da aprendizagem ao longo da vida e da mobilidade uma realidade tangível; melhorar a qualidade e a eficácia da educação e da formação; promover a igualdade, a coesão social e a cidadania activa; e incentivar a criatividade e a inovação, incluindo o empreendedorismo –, foram definidas as seguintes metas de referência na UE para 2020:

. Pelo menos 95% das crianças (a partir dos quatro anos e até ao início da escolaridade obrigatória) deverão frequentar o ensino pré-escolar;

. A percentagem de jovens de 15 anos com baixos níveis de competências em leitura, matemática e ciências deve ser inferior a 15%;

. A taxa média de abandono escolar deve baixar para menos de 10%;

. Pelo menos 40% das pessoas com idades entre 30 e 34 anos deverão ter concluído uma formação de nível superior;

. Pelo menos 15% dos adultos deverão participar em medidas de aprendizagem ao longo da vida;

. Pelo menos 20% dos licenciados e 6% dos jovens entre 18 e 34 anos com uma qualificação inicial de formação profissional deverão ter realizado um período de estudo ou de formação no estrangeiro;

. A percentagem de jovens dos 20 aos 34 anos que tenham concluído pelo menos o ensino secundário superior e que encontraram emprego no espaço de um a três anos deve chegar aos 82%.

Em 2014, a Comissão Europeia e os países da UE fizeram um balanço dos progressos realizados desde a elaboração do relatório conjunto de 2012. Os progressos no cumprimento das metas de referência da UE são avaliados anualmente no Monitor da educação e da formação.

Fonte: Comissão Europeia