“Aquilo que consideramos como gestão ‘moderna’ foi inventado por indivíduos que nasceram em meados do século XIX”. Quem o afirma é Gary Hamel, um dos poucos remanescentes gurus dos anos dourados do management e o principal precursor da plataforma MIX, a qual visa reinventar a gestão no século XXI. Com quatro anos de existência, a MIX está a revolucionar a forma como se lidera, trabalha e se gera impacto na era da colaboração e da capacidade humana ilimitada
POR HELENA OLIVEIRA

Considerado pelo Wall Street Journal como o mais influente pensador da gestão do mundo, Gary Hamel não deixa os seus créditos em mãos alheias. Mas sabe partilhá-los. O principal impulsionador da plataforma de inovação, aberta a todos os que nela queiram participar, recusa aceitar que a gestão do século XXI continue assente nas regras que a definiram no século XIX. A plataforma Management Innovation eXchange, ou MIX, foi lançada, em 2010, como um movimento que pretende reinventar o management, assente na seguinte premissa: enquanto a gestão “moderna” constitui uma das mais importantes invenções da humanidade, atingiu agora a sua maturidade enquanto tecnologia e precisa de ser reinventada para uma nova era.Para Gary Hamel e companhia, as práticas de gestão actuais enfatizam o controlo, a eficiência e a disciplina acima de qualquer outra coisa e isso constitui um problema. Para se ultrapassarem os desafios do século XXI, as organizações têm de ser adaptáveis, inovadoras, inspiradoras e socialmente responsáveis. Até aqui, nada de novo. Mas como ir ao encontro destes predicados definidos já há algum tempo mas raramente colocados em prática? Para o movimento MIX, a gestão precisa urgentemente de ter a sua revolução, alterando os seus princípios e práticas e só com o poder colectivo será possível alcançar este objectivo.O MIX poderá ser entendido como um laboratório virtual, que está a acelerar o ritmo da inovação na gestão, funcionando como uma conversa global em torno dos mais complexos desafios que são enfrentados pelos gestores da actualidade. Os seus membros podem documentar, partilhar e desenvolver as suas ideias e práticas, abandonando gradualmente a gestão 1.0 e preparando o salto imprescindível para uma nova era.

Como se pode ler no site que alberga a plataforma, a gestão consiste na tecnologia dos feitos humanos que, ao longo do último século, contribuíram magistralmente para a prosperidade global. O problema é que as suas maiores conquistas tiveram lugar há várias décadas – da concepção do workflow à gestão de projectos, passando pelos relatórios financeiros e análise da performance, pelos orçamentos ou pela gestão da marca – a verdade é que aquilo que consideramos como gestão “moderna” foi inventado por indivíduos que nasceram em meados do século XIX.

Adjacente a este princípio de identificação e partilha de práticas inovadoras de gestão, o MIX tem vindo a distinguir inovadores (e aspirantes a tal) em todo o mundo, que fazem realmente a diferença, através dos denominados MIX M-Prizes, que incluem “desafios” vários, transformados em concursos de ideias. O artigo que se segue enquadra a gestão de talento na actualidade, identificando as suas principais características e forças, positivas e negativas. Em complemento, o leitor poderá ler, também nesta newsletter, os sete modelos de “trabalho” que melhoram a performance na economia criativa, colaborativa, inter-relacionada e do Big Data da actualidade, vencedores do desafio (e prémio) Unlimited Human Potential M-Prize. O objectivo deste prémio consiste em “descobrir” as mais progressistas práticas, em conjunto com as mais ousadas ideias, que permitem “soltar” e mobilizar a capacidade humana, em qualquer que seja o canto do mundo. Depois de centenas de candidaturas, foram sete as ideias e práticas inovadoras as vencedoras. Mas enquadremos, em primeiro lugar, o ambiente de trabalho vigente na actualidade.

87% dos trabalhadores não gostam do trabalho que fazem

15102014_AeraDaGestaoAnacronica

No mundo actual dos negócios, persiste ainda a velha noção de que as organizações são constituídas por quatro paredes, no interior das quais vivem os trabalhadores, obrigados a reportar o seu trabalho a um qualquer superior hierárquico, que os avalia de acordo com indicadores de desempenho específicos e cujo sucesso se mede pelo número de degraus alcançados na escalada até ao topo. Todo este ambiente responde ainda ao velho conceito de comando e controlo, que reinou na gestão ao longo das últimas décadas. Mas a verdade é que todos estes requisitos estão, gradualmente, a deixar de ter lugar no mundo empresarial.

De acordo com dados divulgados pela plataforma MIX, 35% dos trabalhadores norte-americanos da actualidade situam-se numa categoria de trabalho “eventual”, a qual abriga freelancers, temporários, em regime de part-time ou o equivalente ao nacional regime de “recibo verde”. Noutro tipo de estudos similares, a percentagem deste contingente poderá ascender a 40% ou 50% da força laboral. Adicionalmente, estima-se que os membros da “próxima” geração (muitos deles já pertencentes à actual força de trabalho) mudem de carreira pelo menos 10 vezes até aos 40 anos, ao mesmo tempo que os micro-negócios estão a crescer a um ritmo de meio milhão ao ano [nos Estados Unidos]. Vários estudos indicam também que mais de 70% dos trabalhadores norte-americanos – e 87% em todo o mundo – não se sentem envolvidos e comprometidos com o trabalho que fazem, uma percentagem demasiado pesada para ser ignorada.

Ou, por outras palavras, à medida que os trabalhadores aumentam o seu nível de mobilidade, arriscam as suas qualidades empreendedoras e procuram um trabalho no qual se sintam livres, felizes e “com licença para serem criativos”, as empresas tradicionais tornam-se cada vez menos apelativas, na medida em que continuam a obedecer aos princípios de “obediência institucional” que vigoram desde a Revolução Industrial.

Assim, e de acordo com a plataforma MIX, existe um conjunto de questões relacionadas com a liderança sobre as quais é obrigatório reflectir:

  • Como é possível ampliar as capacidades humanas?
  • De que forma é possível multiplicar o impacto destas “proezas”?
  • E como é possível mobilizar e agregar os diversos contributos dos trabalhadores da actualidade mediante formas mais poderosas e eficazes?

Polly Labarre, considerada como uma das vozes mais influentes da gestão, através do seu trabalho enquanto jornalista, autora e oradora, e que é agora responsável editorial da plataforma MIX, afirma que estas questões são de resposta obrigatória, na medida em que no ambiente económico vigente, criativo e disruptivo, a quota de lucros das empresas depende, em grande parte, da quota de diferenciação que as mesmas apresentam, a qual deriva, por sua vez, de quão profunda, vasta e sistematicamente é possível fazer despertar e alavancar o potencial humano, independentemente do local ou condições em que ele exista.

Enquadrando o desafio do “potencial humano ilimitado”, Labarre divide-o em duas partes: as organizações e os líderes de hoje têm de se concentrar neste “despertar” da capacidade humana – desenhando ambientes e sistemas de trabalho que inspirem os indivíduos a contribuir com a sua imaginação, iniciativa e paixão, de forma contínua – e, por outro lado, agregar essa capacidade humana, através da alavancagem das tecnologias digitais, móveis e sociais, de forma a activar e organizar toda essa pool de talento num mundo que já não tem fronteiras.

Responder a estes dois requisitos constitui o objectivo do desafio lançado pelo Unlimited Human Potential M-Prize, cujas práticas vencedoras poderão ser conhecidas no artigo que se segue, o qual poderá inspirar o leitor a contribuir, com as suas próprias ideias, para revolucionar a gestão.

Editora Executiva

3 COMENTÁRIOS

  1. Gestão por comando e controle não terá mais espaço em um mundo globalizado, dinâmico, aberto

    a variadas transformações , inovações e compartilhamento por redes sociais.

    No entanto , difícil é tirar cada um da sua zona de conforto devido à sua cultura arraigada na gestão

    do passado. Mais uma geração até avançarmos de uma forma razoável. Temas como sustentabilidade,

    inovação , empreendedorismo ainda são ” ameaçãs” aos gestores e lideranças.

    • Caro leitor,
      Mesmo que seja necessária mais uma geração até que os gestores saiam da zona de conforto que refere, a ideia é essa mesma: alterar a cultura organizacional ainda vigente em muitas empresas e adequá-la aos novos desafios globais. Se cada um de nós contribuir da melhor maneira possível, com novas ideias, princípios e um novo olhar sobre o papel das empresas face a todos os seus stakeholders, estaremos já a contribuir para para que essas ameaças que refere se transformem em oportunidades.
      Agradecemos o seu comentário

Comentários estão fechados.